Editorial Estadão: o vexame Jorge Viana e o desprezo do PT pelo que é público

Mudança no estatuto da Apex e indicações para a Petrobras mostram desprezo do PT pelo bom funcionamento do Estado. Lula repete mesmas práticas antirrepublicanas de Bolsonaro

Com razão, Jair Bolsonaro foi muito criticado por desvirtuar o funcionamento da máquina estatal, enfraquecendo mecanismos de controle em benefício de interesses particulares. Ao longo dos últimos quatro anos, foi visível a tentativa bolsonarista de apropriar-se do Estado para fins não previstos na Constituição e na legislação. Agora, o governo de Lula da Silva tenta fazer o mesmo, como se as regras de proteção do Estado não valessem para o PT.

Dois casos recentes são particularmente escandalosos. Conforme revelado pelo Estadão, o presidente da Agência de Promoção de Exportações do Brasil (Apex-Brasil), o ex-senador Jorge Viana (PT-AC), promoveu, em março, uma mudança no estatuto do órgão em benefício próprio, excluindo a exigência de inglês fluente para ocupar o cargo responsável por divulgar os produtos brasileiros no exterior. Segundo a assessoria de Jorge Viana admitiu ao jornal, ele não domina a língua inglesa. Fala, “mas não a ponto de fazer um discurso”.

Originalmente, o estatuto da Apex-Brasil exigia um certificado de proficiência ou de conclusão de curso de inglês, de nível avançado. Agora, diz apenas que “preferencialmente” o presidente e os diretores “deverão ter fluência ou nível avançado do idioma inglês”. Ou seja, diminuiu-se a exigência técnica de um cargo público – exigência esta absolutamente razoável tendo em vista o escopo do órgão – para que fosse possível lá instalar um companheiro sem a devida qualificação.

Em janeiro de 2019, Jair Bolsonaro também nomeou para a presidência da Apex-Brasil uma pessoa que não era fluente em inglês. Após a imprensa revelar que o nomeado tinha se recusado a fazer um teste de inglês, ele foi demitido, tendo ficado apenas oito dias no cargo.

A agravar a história da Apex-Brasil sob a gestão petista, Jorge Viana empregou no órgão um mochileiro, um cantor e um arquiteto para cuidar da promoção dos produtos brasileiros no exterior, mostrou o Estadão. Nenhum dos três tem experiência na área de comércio internacional, mas os três fazem parte do grupo político do ex-senador petista no Acre. É o PT mostrando, sem nenhum pudor, seu apetite para aproveitar-se do aparato estatal em benefício próprio.

O segundo escândalo envolve, vejam só, a Petrobras. O governo de Lula da Silva indicou nomes para o Conselho de Administração da empresa de capital misto. O setor de governança da empresa rejeitou 4 dos 11 indicados pelo governo, em razão da existência de conflito de interesse ou de não preenchimento dos requisitos e condições legais. Diante desse parecer, o mínimo que o Palácio do Planalto deveria fazer era indicar outros nomes, por respeito à empresa, por respeito à legislação vigente que protege a empresa e por um mínimo de cuidado depois de todos os escândalos do PT envolvendo a Petrobras.

No entanto, o governo de Lula da Silva considera-se acima das regras de compliance. Ignorando o parecer da Petrobras, o Ministério de Minas e Energia reiterou a indicação de nomes que haviam sido vetados. Com esse modo de proceder, Lula da Silva seguiu exatamente seu antecessor, Jair Bolsonaro, que também insistiu em indicações desaconselhadas pela governança da Petrobras.

É assim, com desleixo pelas normas que preservam o funcionamento do Estado, que se criam as condições para os casos de corrupção, de ineficiência e de mau uso dos recursos públicos. Não é por acaso que os escândalos ocorrem. Quando se ignoram deliberadamente os alertas e, pior, quando se desprezam as exigências legais, o Estado fica desprotegido, refém de uma dinâmica de poder que pretere o interesse público para atender a questões privadas.

Diante desse comportamento que debilita as instituições, é de perguntar: Lula da Silva não tinha ninguém a indicar para a presidência da Apex-Brasil que falasse inglês fluentemente? Não é possível compor o Conselho de Administração da Petrobras cumprindo integralmente os requisitos legais e sem envolver conflitos de interesse? Por que tamanho desprezo pelo que é público, pelo que é da coletividade?

Estadão

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