MPF quer saber por que o Cadastro Único não pede nome social, orientação sexual e identidade de gênero

O Ministério Público Federal (MPF), por meio da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) no Acre, instaurou inquérito civil para apurar a falta dos campos ‘nome social’, ‘orientação sexual’ e ‘identidade de gênero’ no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (Cadastro Único), administrado pelo Ministério da Cidadania. Decorrido quase um ano após provocação do MPF, não há informações de avanços em discussões, pelo Ministério, para garantir a coleta de dados oficiais sobre a população LGBTQIA+ do país.

O Cadastro Único é o principal instrumento do Estado brasileiro para a seleção e a inclusão de famílias de baixa renda em programas federais, utilizado obrigatoriamente para a concessão dos benefícios do Programa Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família), Tarifa Social de Energia Elétrica, Auxílio Gás, Programa Minha Casa Minha Vida/Minha Casa Verde Amarela, além de servir para a seleção de beneficiários de diversas políticas públicas dos governos estaduais e municipais.

Ao instaurar o procedimento, o procurador da República Lucas Costa Almeida Dias afirma que o direito fundamental à igualdade e o próprio valor da dignidade da pessoa humana, ambos previstos na Constituição Federal, impõem o respeito às diversas formas de existência. Ele cita também a obrigatoriedade imposta pelo Decreto no 8.727/2016, que determina o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de mulheres transexuais e travestis, e homens trans no âmbito da administração pública federal.

Para Lucas Costa Almeida Dias, a falta dos campos no Cadastro Único agrava a invisibilidade dessas pessoas dentro do estrato social abarcado pelos programas atendidos pelo cadastro, o que dificulta ainda mais o acesso a fatores decisivos para romper o ciclo de exclusão, como emprego e renda. “Esse ciclo é muitas vezes iniciado no núcleo familiar e culmina em evasão escolar, situação de rua, insegurança alimentar, desemprego, informalidade/marginalização no mercado de trabalho e vulnerabilidade social”, afirma o procurador.

Solicitação ao Ministério da Cidadania – Atendendo a pedido de informações do MPF, em meados do ano de 2022, o Ministério da Cidadania informou que, naquele momento, seria impossível executar alterações no cadastro por se tratarem de informações que dizem respeito à intimidade das pessoas e têm forte caráter individual. Além disso, as mudanças nos formulários demandariam modificações tecnológicas, debates internos entre o Ministério e os gestores estaduais distritais e municipais do Cadastro Único, além de outros órgãos públicos, instituições de pesquisa oficiais e setores da sociedade civil interessada.

Segundo o MPF, depois de quase um ano desta resposta, não há, até o momento, informação de que os debates e modificações citados pelo Ministério da Cidadania foram sequer iniciados. Além disso, com relação à alegada sensibilidade dos dados, o tratamento de dados sensíveis não é novidade nos formulários do Cadastro Único, já que o quesito sobre cor e raça, por exemplo, também faz parte desse grupo, suscita dúvidas na população e é objeto de treinamento no Manual do Entrevistador.

Após a coleta de novas informações a serem prestadas pelo Ministério da Cidadania, o MPF irá analisar as medidas cabíveis para o caso.