Covid grave pode diminuir células do câncer, indica estudo preliminar

Covid grave pode diminuir células do câncer, indica estudo preliminar

Pesquisadores dos Estados Unidos encontraram uma possível explicação para os casos graves de Covid-19 que coincidiram com a regressão de tumores cancerígenos. Em um estudo inovador, os cientistas do Northwestern Medicine Canning Thoracic Institute, dos Estados Unidos, mostraram evidências preliminares de que a infecção pelo coronavírus ativa uma resposta imunológica específica que “encolhe” as células do câncer.

O estudo foi publicado, na sexta-feira (20/11), no The Journal of Clinical Investigation, uma revista científica de relevância internacional. A descoberta pode abrir caminho para novos tratamentos contra o câncer.

Durante a pandemia, um acontecimento inusitado chamou a atenção dos médicos. Alguns pacientes com câncer apresentaram regressão da doença após o diagnóstico de Covid grave, levantando a dúvidas sobre alguma conexão entre o vírus e alterações no sistema imunológico.

Em um estudo realizado em laboratório com animais e células humanas, os pesquisadores observaram que o RNA do vírus Sars-CoV-2 (causador da Covid-19) levou ao desenvolvimento de um tipo específico de célula imune com propriedades anticancerígenas.

Essas células, que foram chamadas de monócitos não clássicos induzíveis (I-NCMs), trabalharam atacando as células de alguns tipos de câncer, incluindo melanoma, câncer de pulmão, mama e cólon. A descoberta ajuda a explicar o mecanismo por trás da regressão de certos tipos de câncer após a infecção pelo coronavírus.

“Esta descoberta abre um novo caminho para tratamentos contra o câncer. Embora isso ainda esteja nos estágios iniciais e a eficácia tenha sido estudada apenas em modelos animais pré-clínicos, há esperança de que possamos usar essa abordagem para beneficiar pacientes com cânceres avançados que não responderam a outros tratamentos”, afirma o chefe de cirurgia torácica e diretor do Canning Thoracic Institute, Ankit Bharat, em comunicado à imprensa.

Ankit Bharat, autor sênior do estudo feito no Northwestern Medicine Canning Thoracic Institute

Células imunológicas trabalhando contra o câncer

É conhecido que as infecções por vírus alteram substancialmente a imunidade das pessoas — para melhor ou pior. Em alguns casos de infecção de vias aéreas superiores, como pneumonias virais, por exemplo, os pacientes ficam mais suscetíveis a infecções bacterianas. “Os vírus têm poder sobre a imunidade”, explica o oncologista Gustavo Fernandes, diretor nacional de Oncologia na Rede Dasa.

Também há vírus sendo estudados para o tratamento do câncer, são chamados de vírus oncolíticos. O vírus da zika, por exemplo, vem sendo pesquisado para o desenvolvimento de um possível tratamento contra o câncer no sistema nervoso central.

No estudo do Northwestern Medicine Canning Thoracic Institute, os pesquisadores perceberam que as células I-NCMs se diferenciaram dos monócitos comuns, e conseguiram viajar além dos vasos sanguíneos, se infiltrando dentro dos tumores. As células imunológicas comuns não costumam ter essa vantagem.

Uma vez dentro dos tumores, elas liberaram substâncias químicas que recrutaram células assassinas (NK) que atacaram as células cancerígenas diretamente, ajudando a encolher o tumor.

Novos tratamentos

O oncologista Gustavo Fernandes destaca que a pesquisa pode contribuir com o desenvolvimento de medicamentos e terapias que consigam multiplicar esse monócito especial. O passo seguinte seria infundi-lo nos pacientes como uma forma de tratamento para o câncer.

“Seria algo possível e comparável à terapia celular com TILs, um tipo de linfócitos infiltrados no tumor, que é removido do paciente, multiplicado em laboratório e reinfundido. Mas essa é uma terapia que ainda não está disponível no Brasil. É uma avenida nova de conhecimentos para se explorar”, destaca.

O médico alerta que os pacientes não devem baixar a guarda para a infecção do coronavírus acreditando que serão curados do câncer. Fernandes lembra que o estudo aponta apenas um novo caminho, que ainda deve ser amplamente pesquisado. “Ainda estamos numa fase bem anterior ao desenvolvimento de um tratamento e segue válida a recomendação de que o paciente oncológico tome todos os cuidados possíveis para não pegar doenças infecciosas durante o tratamento”, afirma.

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Fonte: Metrópoles