Mirando melhorar a popularidade, o governo Lula (PT) começou a destravar o empréstimo consignado para trabalhadores da iniciativa privada, contratados via CLT. O tema, que estava sendo discutido há meses dentro do governo, entre os ministérios da Fazenda e do Trabalho e as instituições financeiras, teve avanço nessa quarta-feira (29/1), com o anúncio de uma plataforma virtual para concentrar o acesso ao crédito a milhões de brasileiros.
Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, todos os trabalhadores celetistas serão beneficiados. Criado em 2003, o consignado é usado amplamente por servidores públicos e aposentados e pensionistas, que têm acesso facilitado em razão da estabilidade.
“Estamos democratizando o crédito barato, algo que hoje é muito restrito a esses dois públicos [servidores públicos e aposentados]”, destacou Haddad.
Entenda
- Governo federal vem discutindo há meses mecanismos para implementar o crédito consignado a trabalhadores da iniciativa privada;
- Hoje, a concessão de empréstimo consignado para celetistas envolve convênios das instituições financeiras com as empresas, o que exclui um amplo número de trabalhadores, como funcionários domésticos e empregados do Simples Nacional ou de pequenas empresas;
- No cenário atual, funcionários públicos e aposentados movimentam cerca de R$ 600 bilhões em crédito consignado. Por outro lado, os trabalhadores da iniciativa privada somam em trono de R$ 40 bilhões. Com a plataforma anunciada nessa quarta, a Febraban estima que a carteira de crédito consignado dos trabalhadores privados pode triplicar, chegando a R$ 120 bilhões;
- Governo ainda precisa submeter texto ao Congresso Nacional, via medida provisória (MP) ou projeto de lei (PL). Previsão é fevereiro;
- O Ministério do Trabalho e Emprego defende que o consignado privado substitua o saque-aniversário do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Por falta de consenso, não houve ainda decisão sobre manutenção ou não da modalidade de saque;
- Agenda de acesso ao crédito é uma das apostas do governo Lula para melhorar a popularidade, que está em baixa.
O eSocial vai se tornar o veículo de oferta e contratação do consignado para esses trabalhadores. Nesse sistema, estão unificadas as informações das relações de natureza trabalhista.
A ideia foi apresentada por Haddad e pelo ministro do Trabalho, Luiz Marinho, após reunião no Palácio do Planalto, comandada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com os CEOs dos principais bancos privados do país e representantes da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
Pesquisa Genial/Quaest divulgada na última segunda-feira (27/1) mostrou que a aprovação do governo Lula caiu de 52% para 47% no último mês. Parte importante dos entrevistados apontou a alta no preço dos alimentos e a regulação do Pix como notícias negativas que viram sobre o governo.
Desde o início da série histórica da pesquisa, iniciada em fevereiro de 2023, é a primeira vez que a desaprovação do governo Lula supera, numericamente, sua aprovação.
A melhoria do acesso ao crédito é uma das medidas defendidas pelo presidente da República para reverter esse cenário.
A Zetta, associação que reúne empresas de tecnologia com atuação no setor financeiro, apoiou a iniciativa do governo de reformular o consignado privado. Ela reforçou a importância de assegurar a ampla competição, a viabilidade econômica, uma melhor experiência ao usuário e a simetria de informações entre instituições.
A entidade, porém, defendeu uma ampliação dos canais de acesso ao novo empréstimo consignado para além da CTPS Digital, incluindo os aplicativos das instituições financeiras.
A Zetta também entende ser necessário um período de transição para que instituições interessadas possam se adaptar e competir em igualdade às instituições que já atuam atualmente no mercado de consignado.
A plataforma não estará disponível imediatamente após o anúncio. O programa ainda precisa ser criado legalmente pelo governo federal, o que pode ser feito por medida provisória (MP), que tem força de lei e efeito imediato a partir da publicação no Diário Oficial da União (DOU), ou por projeto de lei (PL), cuja aprovação e início da vigência levam mais tempo. Esse encaminhamento deverá ser feito ao Congresso Nacional até fevereiro.
Saque-aniversário
As instituições financeiras defendem que o atual formato do saque-aniversário pode ser revisto, com redução do número de parcelas que podem ser antecipadas, por exemplo, trazendo adequações e melhorias nos pontos críticos.
A Zetta entende que o novo consignado privado é uma modalidade complementar e distinta da antecipação do saque-aniversário do FGTS, motivo pelo qual este deve ser preservado em paralelo ao aprimoramento do consignado privado.
Já o ministro do Trabalho chamou o saque-aniversário de uma “encalacrada” criada pelo governo anterior. Na visão de Marinho, o saque fragiliza o financiamento do sistema habitacional, em especial o Minha Casa, Minha Vida (MCMV), e causa riscos para o trabalhador.
O saque-aniversário permite ao trabalhador retirar parte do saldo da conta do FGTS anualmente, no mês de aniversário. O trabalhador pode optar pela antecipação de até cinco períodos, na forma de empréstimo.
O acesso ao crédito é feito sem burocracia, exigindo apenas que o cadastro do usuário esteja atualizado. Cada instituição financeira oferece uma condição diferenciada, e o trabalhador pode fazer consultas em cada banco sem custos. Mesmo pessoas que estão negativadas conseguem acessar esse crédito.
No entanto, ao optar pela modalidade do saque-aniversário (independente de ter feito ou não a antecipação do saldo), em caso de demissão, o trabalhador só poderá sacar o valor referente à multa rescisória — ou seja, não é permitido retirar o valor integral da conta. A adesão ao saque-aniversário é opcional.
Para alguns especialistas, o saque-aniversário (seja ele depositado no mês de aniversário ou contratado na forma de crédito) é como se fosse o 14º salário do trabalhador.
Fonte: Metrópoles