Os tratamentos contra o câncer têm avançado consideravelmente nos últimos anos, oferecendo novas esperanças para os pacientes. Terapias focadas em subtipos específicos dos tumores e o uso de estratégias combinadas para aumentar as defesas do organismo fizeram as chances de sobrevida dessas pessoas crescerem.
Entretanto, estes mesmos tratamentos inovadores esbarram em desafios em relação aos efeitos colaterais a longo prazo e seus impactos na qualidade de vida dos pacientes nos anos extras que eles ganham.
“Toda vez que avançamos na medicina, passamos a lidar com os desafios de conviver com a pessoa que vive mais. Com as quimioterapias que tínhamos há 20 anos, por exemplo, mais mulheres começaram a sobreviver ao câncer de mama. Mas anos depois, acabavam desenvolvendo leucemia. Ao identificar este problema, buscamos alternativas que fossem menos tóxicas aos pacientes”, afirmou a hematologista Deise Almeida, diretora oncológica da Johnson & Johnson, em encontro com a imprensa.
A médica aponta que problemas semelhantes provavelmente serão enfrentados no futuro, mas que a medicina tem se preparado para que os pacientes mantenham a qualidade de vida.
“Sabemos que as terapias que usamos hoje estão prolongando a vida das pessoas e temos seguido todos os passos da ciência segura, atentos às alterações que esses primeiros pacientes apresentarem”, completou.
Os avanços do combate ao câncer
Dois dos cânceres que mais experimentaram inovações tecnológicas nos últimos anos foram os de pulmão e os de sangue, em especial o mieloma múltiplo.
O mieloma múltiplo é um câncer que atinge o plasmócito, uma das células do sistema de defesa do corpo, responsável por produzir os anticorpos. Mas quando fica doente, essa célula acaba fabricando a proteína monoclonal, uma espécie de anticorpo maligno que causa danos especialmente aos rins.
“O horizonte de tratamento não para de se expandir. Quando comecei, a sobrevida média de um paciente era de 3 anos após o diagnóstico e menos de 5% sobrevivia 10 anos. Hoje são 40% dos pacientes ultrapassando uma década após o diagnóstico”, disse o hematologista Angelo Maiolino, presidente da Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH).
Tratamentos como o CAR-T e a imunoterapia específica para fortalecer as defesas do organismo tornaram o tratamento de pacientes com mieloma múltiplo menos desafiador. Ainda assim, algumas consequências inesperadas destas terapias começaram a aparecer nos últimos anos. Um exemplo disso é o risco de desenvolver tumores secundários anos depois dos ciclos de CAR-T.
“Os tratamentos mais modernos também têm suas toxicidades, claro, mas quando pensamos em relações de risco e benefício, quando a gente considera essas chances, o benefício supera fartamente as circunstâncias que podem aparecer. Hoje temos pacientes com 90 anos que estão com opções de tratamento para mieloma múltiplo. No passado, isso não existia”, pontuou Maiolino.
Desafios dos tratamentos de longo prazo
Quando pensamos na evolução do tratamento, não podemos deixar de citar o câncer de pulmão. Os pacientes da doença ganharam novos medicamentos e alternativas terapêuticas nos últimos anos.
O tumor permanece sendo um dos com mais alta mortalidade no mundo, mas o tratamento ganhou novos pilares que aumentaram consideravelmente as chances de sobrevivência dos pacientes. “Nos últimos 20 anos, quadruplicamos a sobrevida de pessoas com câncer de pulmão”, diz o oncologista Carlos Henrique Andrade Teixeira, do Centro de Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (HAOC).
Carlos Teixeira credita estes avanços a alguns fatores: o programa brasileiro de combate ao tabagismo; o melhor sequenciamento genético dos tumores, que permitiu entender os mais de 20 subtipos específicos; e o surgimento de novos tratamentos. “Em especial a imunoterapia, que melhorou a capacidade das defesas do corpo de entender os disfarces das células tumorais”, disse.
Entretanto, após os intensos tratamentos de câncer de pulmão, os pacientes ainda acabam enfrentando toxicidades tardias. “Antigamente, estes efeitos eram maiores, como com a demência provocada por radioterapia. Mas hoje, com os pacientes vivendo tanto tempo mais, novos desafios têm aparecido, como problemas na pele e no cabelo”, afirmou o médico.
“Nossa missão é dar suporte para que os pacientes tenham as queixas ouvidas e pensemos em novas alternativas para dar sempre a eles o melhor cenário possível”, disse Teixeira.
A importância de um acompanhamento contínuo e detalhado se torna ainda mais clara quando se pensa no impacto psicológico e físico que esses tratamentos podem ter.
Neste cenário, o futuro da oncologia parece promissor, com novas terapias oferecendo mais esperança para os pacientes, mas ainda está longe de ser uma solução mágica isenta de riscos. A oncologia do futuro será cada vez mais personalizada e os desafios que ela traz consigo também.
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Fonte: Metrópoles