A esclerose múltipla é uma doença neurológica crônica, marcada por sintomas variados e muitas vezes inespecíficos. Essa característica pode dificultar o diagnóstico, como aconteceu com Franthieska Vitorino, de 27 anos. Em entrevista ao Metrópoles, a americana conta que passou quatro anos convivendo com sensações estranhas no corpo, que sempre atribuía ao estresse ou a outras causas cotidianas.
“Comecei a sentir formigamento na perna, mas achei que fosse pelo cansaço do dia a dia ou pelo colchão. Nunca pensei que precisaria ir ao médico por isso”, lembra a jovem, que tem família brasileira e já morou no Brasil. Os episódios eram intermitentes e pareciam inofensivos: vinham e iam, sem um padrão claro.
Sintomas intermitentes e difíceis de associar
Com o passar dos anos, no entanto, os sintomas ficaram mais intensos e variados. Ela passou a sentir dor nos olhos, cansaço extremo, dormência nas pernas e até dificuldade para caminhar.
“Teve uma época em que meu olho doía até com a claridade. Não aguentava o sol nem a luz do celular. Mas, como passava, eu deixava pra lá”, relembra.
Ainda jovem, aos 18 anos, Franthieska chegou a procurar um oftalmologista por causa de uma dor persistente no olho esquerdo e distorções na visão. O diagnóstico da época foi pressão ocular alta, o que não explicava completamente os sintomas.
Segundo o neurologista Nicolas Balduíno, do Hospital Anchieta, em Brasília, esse tipo de manifestação é comum nos casos de esclerose múltipla.
“A doença afeta o sistema nervoso central e provoca danos na mielina, uma substância que reveste e protege os nervos. Isso gera cicatrizes que interferem na transmissão dos impulsos nervosos”, explicou o médico em entrevista anterior ao Metrópoles.
Nos dois últimos anos antes do diagnóstico, os sinais começaram a afetar diretamente a rotina de Franthieska. “O formigamento virou algo diário. Tinha dias que eu só queria ficar deitada. Pensava que era TPM, ou uma fase ruim. Mas começou a me atrapalhar pra dormir, me sentia exausta, como se não fosse eu mesma”, lembra.
Outro sintoma que chamou atenção foi a dificuldade para engolir líquidos. “Eu me engasgava tomando água e até brincava com meu marido. A gente não imaginava que tinha relação com uma doença”, diz Franthieska.
Diagnóstico só veio após perda de mobilidade
Até as tarefas simples começaram a se tornar difíceis. A jovem conta que sentia fortes dor nas costas após lavar louça e frequentemente perdia força nas pernas. Nos últimos dias antes da internação, o formigamento parou um pouco, mas ela começou a mancar.
Diante da piora, o marido, Arthur Vitorino, 33, que trabalha com construção civil, procurou a ajuda de um amigo médico. Um vídeo mostrando Franthieska tentando vestir um short sem conseguir foi suficiente para o ortopedista recomendar que o casal corresse para a emergência.
Em março deste ano, os dois voltaram ao Brasil e buscaram atendimento na UPA de Mogi das Cruzes, em São Paulo, onde a família mora. “Já estava usando cadeira de rodas e não conseguia andar. A médica pediu ressonância e tomografia, e fui encaminhada ao hospital do SUS”, relata.
O diagnóstico veio após avaliação neurológica, realização de punção lombar e ressonâncias da cabeça e da coluna. “Foram quatro ressonâncias. Descobriram lesões na cabeça, cervical e lombar e confirmaram que era esclerose múltipla”, lembra.
De acordo com Balduíno, o processo de diagnóstico costuma ser desafiador, já que os sintomas podem se confundir com os de outras doenças. “Geralmente, o diagnóstico da esclerose múltipla é baseado em uma combinação de história clínica, exames neurológicos, de imagem e laboratoriais”, afirma.
Adaptação e retomada da rotina
A partir dali, começou o tratamento com natalizumabe, um imunomodulador administrado mensalmente por infusão. Além disso, Franthieska passou por um ciclo de corticoides para controle inicial da inflamação. Ela também adotou mudanças no estilo de vida: passou a se alimentar melhor, eliminou ultraprocessados e incluiu atividades físicas leves na rotina.
A esclerose múltipla é mais comum em mulheres e costuma surgir entre os 20 e 40 anos. “A interação de fatores genéticos, ambientais e imunológicos parece ter um papel importante no desenvolvimento da doença”, esclarece Balduíno.
Apesar de ainda sentir fadiga e formigamentos eventuais, Franthieska relata melhora depois do tratamento. “Minha visão voltou ao normal e já consigo andar sozinha. Sigo trabalhando de casa, como sempre fiz”, diz.
O neurologista reforça que a adesão ao tratamento e o estilo de vida têm impacto direto na evolução da doença. “Muitas pessoas com esclerose múltipla conseguem levar uma vida ativa e produtiva, especialmente com o avanço dos tratamentos disponíveis”, afirma.
Hoje, Franthieska tenta alertar outras pessoas sobre a importância de prestar atenção nos sinais do corpo. “Eu achava que era estresse, TPM, emocional. Como os sintomas vinham e passavam, você não associa uma coisa com a outra. Mas é uma doença muito silenciosa”, finaliza.
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Fonte: Metrópoles