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Presidente da COP30 aborda expectativa e desafios do evento; veja íntegra

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Presidente da COP30 aborda expectativa e desafios do evento; veja íntegra

A menos de seis meses para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, falou com exclusividade à CNN sobre a expectativa para o evento.

Em uma entrevista ao correspondente Américo Martins, diretamente dos estúdios da CNN em Londres, o presidente da COP30 fez um balanço da Conferência de Bonn, na Alemanha, falou sobre os desafios de financiamento para o combate da mudança climática e abordou os questionamentos sobre a infraestrutura em Belém.

Corrêa do Lago garantiu que a sede da Cúpula do Clima será mantida e afirmou estar confiante no sucesso do evento.

Veja abaixo a entrevista:

CNN: Embaixador, vamos começar então com a questão de Bonn, que é considerada uma espécie de mini COP. Muitas negociações acontecem em Bonn, na Alemanha, onde fica a sede do organismo da ONU que controla mudanças climáticas. Foi o primeiro teste da presidência brasileira da COP. Qual é o balanço que o senhor faz dessa reunião?

André Corrêa do Lago, presidente da COP30: Olha, o balanço foi bom, e a realidade é que havia uma enorme expectativa porque a gente veio com muitas ideias novas, com uma equipe muito boa, e nós não sabemos muito bem como como seria a reação, porque, como você disse, é uma prévia da COP, mas é também a primeira reunião oficial depois da COP de Baku.

E na COP de Baku, como você sabe, vários países ficaram com um certo gosto amargo, sobretudo na área de financiamento. Então, a gente não sabia muito bem como os países reagiriam, e o Brasil propôs um caminho, inclusive, de avançar nos documentos que a gente teria que negociar também em Belém.

Podemos dizer que foi boa a reunião, porque a gente conseguiu avançar em vários documentos que estavam meio emperrados e que já vão chegar em Belém já bastante adiantados.

CNN: Quais são esses documentos em que houve progresso?

André Corrêa do Lago: Olha, tem dois temas muito caros aos países em desenvolvimento que estavam sendo tratados. Como você sabe, as negociações de mudança do clima são basicamente separadas entre mitigação e adaptação. Então, mitigação é quando você reduz as emissões, e a adaptação é quando você incorpora as mudanças do clima que já estão acontecendo na sua vida. Eu acho que um exemplo, infelizmente, que nós tivemos no ano passado foi Porto Alegre.

Porto Alegre poderia ter sido menos grave se a gente tivesse feito investimentos de adaptação, sabendo que vão aumentar as chuvas, sabendo da intensidade. Isso aconteceu também na Espanha, aconteceu em vários países do mundo. E aí nós tivemos também um caso muito claro que só a mitigação resolve, que é o caso dos rios sem água na Amazônia. Não há nada que você possa fazer para se adaptar a isso, né? Então, realmente é reduzir as emissões para reduzir a intensidade da mudança do clima.

CNN: Falando em pagar conta, um dos grandes dramas que teremos — e temos em todas as COPs, não é algo só da COP de Belém — mas um dos grandes debates é como nós vamos fazer o mundo desenvolvido, que é o principal poluidor, o principal responsável pelas mudanças climáticas historicamente, assumir a conta que eles precisam pagar e chegar a US$ 1,3 trilhão? Em Bonn não houve grandes progressos. Como é que nós vamos chegar em Belém com essa conta? O mundo desenvolvido vai arcar com o custo?

André Corrêa do Lago: Teve uma decisão em Baku que foi de pedir para que o presidente da COP29, Mukhtar Babayev, e eu, presidente da COP 30, nós devemos apresentar um mapa do caminho para chegar a esse US$ 1,3 trilhão. Só que esse mapa do caminho vai ser uma proposta nossa, dos dois, com base em várias propostas que nós estamos recebendo de países, de organizações, de bancos de desenvolvimento.

Nós estamos juntando muitas ideias de como esse dinheiro poderia vir. Mas grande de parte desse desses recursos vão vir como investimento. Mas qual é a ironia? É que os países em desenvolvimento não só não recebem dinheiro público, como também são considerados de alto risco, e, portanto, também não recebem dinheiro privado.

Então, esses ajustes com o apoio de bancos de desenvolvimento, com apoio de várias instituições que existem, têm que ser estruturados de maneira mais eficiente, mas também de maneira muito mais rápida, porque a ciência nos mostra que há uma urgência climática, e a gente não tem tempo de passar 20 anos bolando um sistema financeiro que funciona. Ou seja, tem que fazer o mais rápido possível.

CNN: O mundo desenvolvido diz que não tem dinheiro para esse investimento no clima, mas esta semana, aqui na Europa, nós tivemos uma reunião da OTAN, e 31 dos 32 países da Otan concordaram em chegar a um investimento de 5% do seu PIB em defesa até 2035. Mas ninguém fala em destinar 5%, ou até mesmo 0.5% do PIB para clima. Como o senhor vê isso? 

André Corrêa do Lago: A crise da mudança do clima é muito diferente dessas outras. Primeiro, porque ela é constante, ou seja, não é o fato de você preferir gastar dinheiro em uma coisa ou na outra que vai fazer com que a crise do clima espere. Mas também porque a crise do clima tem um impacto muito grande sobre todos os temas que a gente tá falando, inclusive a questão de segurança.

Então, eu acho que há uma guerra que seria necessária, seria uma guerra contra o clima. A ministra Marina Silva menciona isso várias vezes. Essa realmente é uma guerra que é necessária e que traria resultados extremamente positivos para toda a população.

CNN: Um outro tema que é sempre lembrado nas COPs é a questão dos combustíveis fósseis. Qual é a sua expectativa especificamente em Belém do que pode sair acordado entre todos os países com relação ao petróleo?

André Corrêa do Lago: Pois é, as COPs tem várias dimensões, né? Então alguns resultados vão ser da reunião dos chefes de Estado. Outros resultados vão ser da negociação formal entre os países. E outros resultados vão vir da agenda de ação, que é toda essa programação que a gente tem na COP em que você envolve os atores que não negociam. São os governos de Estado, as prefeituras, a sociedade civil, investimento privado, tecnologia, todo esse sistema.

Então, eu acho que a gente pode ter resultados em várias dessas áreas, inclusive de como nós vamos poder estimular que diferentes soluções sejam encontradas, porque cada país tem um desafio diferente. Há países que cuja economia inteira depende de combustíveis fósseis.

O Brasil já avançou imensamente na sua transição. Nós somos o país que todo mundo admira por ser uma economia tão grande que tem 90% da eletricidade renovável. Mas há países que ainda dependem da eletricidade em 90% de carvão, por exemplo. Cada país tem uma situação diferente. E eu acho que isso é uma coisa muito importante, a COP trazer soluções.

Eu acho que há muitos indicadores de que que nós estamos avançando, mas ao mesmo tempo nós também sabemos que essa transição vai precisar ainda de fósseis. Não há a menor dúvida, você não pode parar de repente a economia mundial de um dia para o outro, ou seja, essa transição, na verdade, são várias transições, e cada país tem que encontrar a sua e decidir soberanamente qual é o caminho que ele quer seguir.

CNN: Uma crítica que se faz ao Brasil é que nós vamos sediar a COP, na Amazônia, e há um debate muito grande sobre a exploração de petróleo na margem equatorial. Tudo indica que o governo pretende, de fato, explorar petróleo, usar essa fonte de energia, usar essa oportunidade que poderia, inclusive, levar o desenvolvimento de uma parte importante no norte do Brasil. Mas isso abre espaço para uma crítica ao Brasil porque, afinal de contas, as ações contam muito nas negociações. Esse tipo de decisão, às vésperas da COP, enfraquece a nossa posição na negociação?

André Corrêa do Lago: Olha, o Brasil é visto como um país que reflete a diversidade e a complexidade de todos os temas relacionados à mudança do clima. A floresta, por exemplo: o Brasil tem a maior parte das suas emissões ligadas ao desmatamento, uma das maiores economias do mundo, é um perfil totalmente diferente. É um país que é o campeão das renováveis, mas que descobriu, mais tarde que os outros, petróleo. É um país que tem várias realidades e, por isso, de certa forma, o Brasil é visto como uma referência.

E é esse tipo de dúvida ou esse tipo de decisão que um país deve tomar, sobre o que ele vai fazer com algumas de suas riquezas. Esse é um dos grandes temas da COP. Então, o Brasil é o lugar natural para a gente ter esse tipo de debate, e nós sabemos que infelizmente esse debate tá muito “Fla-Flu”, né? Quer dizer, ou você é totalmente favorável à exploração do petróleo, ou você é totalmente contrário à exploração do petróleo. Os recursos do petróleo poderiam ser usados, por exemplo, numa aceleração da transição. Tem várias fórmulas que você poderia usar.

CNN: Mas a questão disso acontecer pouco antes da COP não enfraquece a nossa posição?

André Corrêa do Lago: Olha, o Brasil é uma democracia, e isso é uma das grandes forças que nós temos. Há várias opiniões divergentes, há vários processos que andam em paralelo.

Então, eu acho que, de certa forma, talvez fortalece a posição do Brasil como um país de referência, de justamente não estar tentando fazer uma festa que a gente tá colocando um tapume para esconder um problema. Não, todas essas questões têm que ser discutidas abertamente, e eu acho que isso nos fortalece.

CNN: Uma outra questão que também foi levantada em Bonn é a questão sobre a infraestrutura em Belém. Temos um problema de estrutura, e muitos países levantaram essa questão durante a reunião. Não é exatamente a sua responsabilidade garantir acesso para todos. Mas como vamos resolver esse problema para que a COP seja de fato um sucesso?

André Corrêa do Lago: Olha, o governo federal está investindo enormemente em Belém, mas está investindo pensando muito no legado da COP, ou seja, os investimentos não estão dirigidos para o evento em si, estão dirigidos para melhorar Belém e para que a população seja beneficiada por isso. Então, a maior parte dos investimentos não está dirigida para a infraestrutura específica da COP.

Agora, o que acontece em Belém, claro, é que é uma capital, mas é uma cidade de tamanho médio, e então não é uma cidade preparada para um evento desse tamanho. A gente não pode esquecer que a COP é a maior reunião internacional do mundo todo ano. Eu acho que a infraestrutura avançou de maneira incrível. Eu acho que a cidade, as pessoas estão envolvidíssimas, estão preparadíssimas. Eu acho que vai ser incrível. Só há realmente um problema que ficou, que é o preço dos hotéis, o preço das acomodações.

CNN: E como resolver isso?

André Corrêa do Lago: Ah, isso é uma ótima pergunta. Tem que ter uma solução que assegure que a COP receba todos os países, por exemplo. Porque se você não tá recebendo todos os países, você tem países que não podem pagar a conta, as diárias, você perde a legitimidade da COP.

Se você tem áreas tão caras que grandes delegações, como a China, como a União europeia, diminuem as delegações, eles vão ter menos gente para trabalhar na COP, você vai ter menos resultado.

Se você não tem lugar para os empresários, você não vai ser a COP de soluções como nós gostaríamos que ela fosse e que fosse um imenso debate sobre as oportunidades econômicas que a mudança do clima representa.

CNN: Mas tem como resolver isso? Qual seria a solução?

André Corrêa do Lago: Ah, eu não sei, mas evidentemente a solução tem que estar dentro de novo das nossas regras, mas alguma coisa tem que ser feita, porque o questionamento em Bonn foi realmente violento. Os preços de hotel em Belém estão três vezes maiores do que a COP mais cara anterior.

CNN: E tem algo que o governo, por exemplo, possa fazer para baixar o preço? Quem poderia fazer alguma coisa?

André Corrêa do Lago: Tem uma equipe equipe incrível que está trabalhando, uma equipe incrível da Casa Civil, e a gente está trabalhando muito juntos. Tem que se achar uma solução. O governador Helder Barbalho está muito envolvido nisso também. Agora tem que ser encontrada uma solução dentro das regras, evidentemente, da legalidade e do que nós temos como legislação. Mas tem que ser encontrada uma solução, porque, infelizmente, é uma questão de preço, não é questão não ter quarto. Porque inclusive tem uma oferta de apartamentos muito boa, mas também os preços apartamentos também estão muito altos.

Mas temos que encontrar alguma solução porque há um movimento inclusive de vários países pedindo para mudar de cidade, vários países estão pedindo.

CNN: E existe essa possibilidade, o senhor acha?

André Corrêa do Lago: Não. Eu acho que é claríssima a determinação do presidente Lula de fazer a COP em Belém e eu acho que a cidade de Belém está se preparando de maneira incrível, a população fazendo tudo. Eu acho que temos tudo para fazer uma COP realmente excepcional.

CNN: Uma última pergunta. Quando tudo acabar, como o senhor vai medir o sucesso da COP30?

André Corrêa do Lago: Ah…bom, não sei.

CNN: Perfeito. Muito obrigado, embaixador.

André Corrêa do Lago: Obrigada.

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