Análise: Após conflito entre Israel e Irã, entram os diplomatas

Após os ataques aéreos dos Estados Unidos contra instalações nucleares do Irã e um cessar-fogo, chegou a hora de dar um passo para trás e avaliar o que mudou no Oriente Médio e as chances de traduzir o sucesso militar em ganhos estratégicos duradouros.

Em uma crise de segurança nacional, o que não acontece pode ser tão importante quanto o que de fato acontece. Isso é particularmente verdadeiro em relação ao recente conflito entre Israel X Irã.

Durante anos, analistas previram que um ataque americano ao Irã resultaria em uma guerra total no Oriente Médio, com centenas, senão milhares de baixas dos EUA e uma escalada que o Irã poderia, em última análise, controlar por meios assimétricos — como milícias em toda a região com armas capazes de atingir funcionários e posições americanas.

Eu achava que essas alegações eram exageradas e produto tanto da propaganda iraniana quanto de análises sólidas.

Isso se mostrou especialmente verdadeiro nesta crise, que se desenrolou após uma degradação de quase 18 meses do poder iraniano por Israel em resposta à decisão fatídica de Teerã de se juntar a um conflito contra o rival logo após o ataque do Hamas a Israel em 7 de outubro de 2023.

Hoje, não temos apenas teorias e previsões sobre a resposta do Irã a um ataque americano, mas também uma experiência real. E, até agora, os pessimistas estavam errados.

Aliados não saíram ao resgate do Irã

O Irã respondeu com um ataque telegrafado e frustrado com mísseis contra uma base dos EUA no Catar, o que serviu apenas para unir os Estados do Golfo na condenação dessa atitude.

As milícias iranianas — desde o Hezbollah no Líbano, já prejudicado após perder o próprio conflito com Israel no ano passado, até as milícias iraquianas sob o controle da Guarda Revolucionária Islâmica do Irã — recuaram completamente.

Em outros lugares, ninguém veio em auxílio do Irã. Há uma teoria nos círculos de política externa de que uma aliança chamada “CRINK” — China, Rússia, Irã e Coreia do Norte — poderia se unir em uma crise ou conflito com o Ocidente.

Sem dúvida, esse conjunto de Estados pode formar parcerias táticas e específicas, como a Coreia do Norte e o Irã apoiando a Rússia na guerra contra a Ucrânia.

Mas quando a situação ficou crítica no Oriente Médio, e o Irã sofreu os maiores golpes militares desde a revolução de 1979, esses parceiros desapareceram.

A China deixou claro que o Irã não deveria pensar em fechar o Estreito de Ormuz, dada a dependência das exportações de petróleo do Golfo, e quando o ministro das Relações Exteriores do Irã visitou a Rússia em meio à crise, ele saiu apenas com uma declaração benigna do Kremlin pedindo a redução da tensão.

Degradação do poder russo no Oriente Médio

Além disso, a estratégia assertiva da Rússia no Oriente Médio, que começou em 2015 com a decisão de Vladimir Putin de apoiar o regime de Bashar al-Assad na Síria, está em desordem.

Putin apostou que o poder importa acima de tudo no Oriente Médio e que, ao ajudar Assad, poderia traduzir tal afirmação de poderio militar em laços mais profundos em toda a região, incluindo Israel e os Estados do Golfo. Mas, esse plano não deu certo.

Hoje, Assad se foi (agora morando em Moscou, após a queda de seu regime), e os russos mal conseguem manter presença na cidade portuária síria de Tartus.

Os temíveis sistemas de defesa aérea russos, conhecidos como S-300, mostraram-se inúteis e facilmente destruídos pelos sistemas militares israelenses, a maioria deles fornecidos pelos Estados Unidos.

Tudo isso mais a guerra da Rússia na Ucrânia, onde sofreu quase 1 milhão de baixas militares e nunca estabeleceu superioridade aérea sobre o território ucraniano, algo que Israel conseguiu sobre o Irã em 24 horas — deixa o Kremlin relutante e incapaz de projetar poder no Oriente Médio, muito menos de prestar assistência tangível ao Irã.

No fundo, o que não aconteceu nesta crise demonstra não apenas a fraqueza do Irã, mas também a fragilidade de uma aliança antiocidental liderada pela Rússia e pela China.

Implicações globais

Pouco depois de o Hamas atacar Israel em 7 de outubro de 2023, eu estava no Salão Oval durante uma conversa telefônica entre o presidente Joe Biden e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu.

O Hezbollah, apoiado pelo Irã, havia acabado de abrir uma segunda frente de conflito no norte israelense, disparando mísseis e foguetes.

Netanyahu fez uma avaliação contundente da situação: No Oriente Médio, se você é percebido como fraco, é atropelado.

Fraqueza gera agressão, especialmente para Israel, que há décadas lida com um Irã comprometido com destruição. O Irã passou esse tempo apoiando milícias como o Hezbollah e o Hamas para colocar o que era conhecido como um “anel de fogo” ao redor de Israel.

Essa decisão foi tomada com o objetivo de pressionar e estrangular o país de forma constante. Israel administrou e conteve essas ameaças durante anos, até 7 de outubro de 2023.

Como escrevi anteriormente, o ataque do Hamas em 7 de outubro, com o massacre de civis e a tomada de reféns, mudou para sempre a doutrina de segurança nacional de Israel.


Membros palestinos das Brigadas Ezz Al-Din Al Qassam, a ala militar do Hamas, queimam veículos blindados militares pertencentes às forças israelenses perto da Faixa de Gaza • Getty Images

O país jamais aceitará a presença de grupos apoiados pelo Irã nas fronteiras e — após os ataques diretos de Teerã contra Israel a partir de território iraniano em abril e outubro do ano passado — também atacará diretamente o Irã quando necessário.

Esta é uma equação inteiramente nova no Oriente Médio e, na minha opinião, provavelmente permanecerá.

Nesse contexto, o que aconteceu nas últimas duas semanas no Irã foi uma consequência previsível da decisão de se juntar a um conflito em múltiplas frentes contra Israel após 7 de outubro. No entanto, o significativo sucesso militar da campanha israelense não foi inevitável.

Em questão de 12 dias, Israel eliminou o alto escalão militar do Irã, seus principais cientistas nucleares, suas instalações de produção de mísseis e a maioria de suas instalações nucleares, exceto aqueles profundamente enterrados, como a unidade de enriquecimento de Fordow ou as áreas de armazenamento de Isfahan.

Essa demonstração de inteligência e domínio militar repercutirá em todo o Oriente Médio nos próximos anos. Israel é agora a potência militar dominante na região, uma reviravolta notável em relação a apenas 20 meses atrás.

A afirmação de poder militar dos Estados Unidos também pode ter implicações globais.

Os bombardeiros B-2 dos Estados Unidos que atingiram o Irã saíram de dentro dos EUA e lançaram munições guiadas que nenhum outro país possui com precisão milimétrica, por três poços de ventilação — tudo isso sem a necessidade de uma plataforma ou base regional.

A dissuasão em assuntos globais reside na combinação única de capacidades militares aliada à vontade percebida de utilizá-las.

Essa afirmação de força, sem se prender a objetivos em expansão e metas pouco claras, será notada por outros líderes mundiais, que agora podem pensar duas vezes antes de testar os Estados Unidos.

Incerteza sobre destruição do programa nuclear do Irã

Com base em tudo o que sabemos até o momento, o programa nuclear do Irã sofreu um retrocesso significativo.

Meu ex-colega Norman Roule, que atuou como gerente da missão do Irã para a comunidade de inteligência dos EUA, disse à CNN que acreditava que o programa nuclear de Teerã havia sofrido um “golpe catastrófico”.

Enquanto os profissionais de inteligência trabalham para avaliar de forma abrangente o que resta do programa nuclear iraniano, essa questão se tornou politizada, com muitos republicanos buscando respaldar a afirmação prematura de Trump.

De acordo com o presidente dos EUA, o programa foi “obliterado”, e muitos democratas estão buscando provar prematuramente que o Irã ainda pode ser capaz de reconstituir rapidamente o programa nuclear.

Em uma questão como essa, paciência e cautela são importantes, porque mesmo que as avaliações se tornem mais abrangentes, pode nunca haver uma decisão “final” ou definitiva.

Deixe-me explicar: Geralmente, existem três níveis de avaliações de danos em combate, ou BDAs. O primeiro ocorre logo após uma operação e se baseia principalmente em imagens que podem estar disponíveis imediatamente ou em cerca de 24 horas.

O segundo adiciona informações adicionais, como se as munições funcionaram conforme o planejado e se pontos específicos foram atingidos. Essa análise também pode avaliar de forma mais completa os danos gerais a um alvo — de leves a moderados e graves.

O terceiro nível é diferente e incorpora todas as fontes de informação, incluindo inteligência, avaliações de parceiros e talvez fontes humanas. Esse processo pode levar semanas e incorpora as opiniões de vários departamentos e agências.

A situação é ainda mais complicada ao avaliar um programa nuclear e o que o Irã pode fazer em resposta.

Compare essa situação com um ataque contra um líder terrorista. A avaliação nessa BDA é, em última análise, binária: o alvo está vivo ou não.

Mesmo uma BDA de Nível 2 pode ser inconclusiva, pois a destruição de um edifício ou veículo não garante a eliminação do alvo. Em um BDA de nível 3, pode haver imagens de um corpo sendo removido, ou mancando, ou preparativos para um funeral, ou reações das contrapartes do alvo.

Ainda assim, é uma conclusão binária — vivo ou morto.

Agora, avaliar um programa nuclear, o que resta dele e o que pode acontecer em seguida é algo bem diferente, não binário e carregado de suposições.

Por exemplo, mesmo que, como foi relatado, o Irã possua um estoque de urânio altamente enriquecido, ele ainda tem as centrífugas de alta potência necessárias para transformar esse urânio em armas?

E, vamos presumir que sim, estamos confiantes de que o Irã tomaria a decisão arriscada de instalar uma série de centrífugas e transportar o urânio, já que Israel ainda controla o espaço aéreo?

Presumimos que isso poderia ser feito sem que Israel ou os EUA soubessem — e, em seguida, tomar novas medidas para destruí-lo, como o presidente Donald Trump sugeriu que estaria preparado para fazer?

Ou presumimos que o Irã está em tal desordem que é improvável que tome tal decisão, ou pelo menos não tão cedo? Ou que é improvável que tome tal decisão sob a ameaça de novos ataques dos EUA e de Israel?

Mesmo na pior das hipóteses, haveria mais perguntas: o Irã ainda possui equipamento industrial para moldar urânio metálico, necessário para a produção de uma bomba?

Se não, quanto tempo levaria para reconstituir o programa nuclear? E o Irã poderia fazê-lo sem que Israel ou os Estados Unidos percebessem e agissem contra tal medida?

Tais avaliações seriam feitas por uma combinação de especialistas da comunidade de inteligência — como a Administração Nacional de Segurança Nuclear do Departamento de Energiados EUA — e analistas políticos, principalmente da CIA, a agência de Inteligência dos EUA.

Esses profissionais estudam e buscam prever a tomada de decisões iraniana, bem como a Agência de Segurança Nacional, com sua expertise única em decifrar sinais de inteligência, que muitas vezes podem ser enganosos.


Mísseis balísticos iranianos são vistos no céu noturno acima de Hebron, Cisjordânia, enquanto o Irã retoma seus ataques de retaliação contra Israel • Wisam Hashlamoun/Anadolu via Getty Images

Por essas razões, quando ouvir que o Irã pode reconstituir seu programa em “meses” ou “anos”, tenha em mente que qualquer avaliação desse tipo se baseia em suposições que podem ou não estar corretas, incluindo suposições secundárias e terciárias que podem ou não estar corretas, e que os Estados Unidos e Israel podem influenciar os cálculos de Teerã.

No governo dos EUA, nas próximas semanas e meses, deve haver um diálogo bilateral entre os profissionais de inteligência e os formuladores de políticas de segurança nacional para determinar o que pode restar do programa nuclear iraniano e o que pode e o que não pode ser facilmente reconstituído.

Em seguida, podem ser decididas quais medidas podem ser necessárias para ajudar a garantir que os elementos mais perigosos do programa — enriquecimento e urânio metálico — não sejam retomados.

Conclusão: este não é o momento para uma volta da vitória, que no Oriente Médio muitas vezes volta para assombrar os presidentes. É hora de uma execução focada e determinada.

Introdução da diplomacia

A operação militar provavelmente prejudicou significativamente a ambição nuclear do Irã, mas transformar esses ganhos militares táticos em sucesso estratégico exigirá um acordo diplomático.

Essa questão pode tão simples quanto o Irã cumprir verdadeiramente os compromissos sob o Tratado de Não Proliferação Nuclear, segundo o qual todo o material e equipamento nuclear iraniano deve ser declarado e submetido à inspeção da Agência Internacional de Energia Atômica.

Ou pode significar um acordo mais abrangente que proíba para sempre o Irã de enriquecer urânio, provavelmente em troca de algum nível de alívio de sanções e apoio internacional para um programa de energia nuclear pacífico.

O objetivo deve ser o último, e como expliquei em minha última análise, a diplomacia aqui tem um prazo embutido, cronometrado para a “retomada” das sanções internacionais, que tanto a França quanto o Reino Unido dizem estar preparados para fazer caso o Irã rejeite um acordo.

Com a autoridade para revogar as sanções expirando em outubro, o início de setembro é visto como um prazo para reinstalar as sanções multilaterais ao Irã que o acordo nuclear da era Obama removeu e que assim permanecem até hoje.

Esta é uma carta que os EUA podem usar efetivamente, em coordenação com Reino Unido e França, para impor um prazo à diplomacia.

Quanto mais o Irã demorar para retornar à mesa de negociações, menos tempo terá para negociar um acordo para evitar a renovação das sanções e a possibilidade de novos ataques militares, caso decida reconstituir seu programa de enriquecimento de urânio.

Momento de garantir cessar-fogo em Gaza

Enquanto isso, uma extensa negociação está em andamento para garantir um cessar-fogo em troca da libertação de pelo menos metade dos reféns ainda mantidos pelo Hamas.

O grupo palestino rejeitou essas ofertas até o momento, mas, com tudo o que aconteceu, há um novo otimismo de que essas negociações possam ter sucesso.

O próprio Trump previu na sexta-feira (27) um cessar-fogo dentro de uma semana. Isso seria uma ótima notícia e deveria ser o objetivo, embora eu preveja que um resultado possa demorar um pouco mais, à medida que a poeira baixar no Irã.

Há também um otimismo renovado em relação à expansão dos Acordos de Abraão, à medida que os países árabes avaliam as novas equações de poder e podem buscar colher os frutos da cooperação econômica e tecnológica com Israel, que agora é visto como a potência mais avançada e de alta tecnologia da região.

Com o tempo, essa tendência é provável, na minha opinião, mas não antes que Gaza retorne à fase de cessar-fogo e seja finalmente resolvida.

É improvável que Israel consiga “ter o bolo e comê-lo também”, já que o conflito em Gaza continua sendo uma preocupação grave para as populações de toda a região e poucos líderes árabes estariam preparados para dar um passo em direção a Israel até que possam ter certeza de que o conflito está se acalmando completamente.

Conclusões

Então, como tudo isso vai se desenrolar?

Sempre há a chance de que o regime iraniano, agora desesperado por sobrevivência, faça tudo o que puder para juntar o que resta de seu programa nuclear e correr atrás de uma bomba.

É importante se proteger contra essa possibilidade, mas ela parece implausível — tanto em relação ao que o Irã estaria disposto e seria capaz de fazer, dados seus impasses, quanto ao que Israel e os Estados Unidos poderiam ver e impedir.

Há também o argumento otimista de que a operação americana atrapalhe definitivamente as ambições nucleares do Irã e que a região esteja agora à beira de eventos dramáticos e positivos.

Isso inclui a expansão dos Acordos de Abraão e até mesmo um potencial colapso do regime teocrático em Teerã, uma mudança histórica nos assuntos mundiais.

Esta versão dos próximos eventos é igualmente implausível, visto que há muitos “spoilers” no Oriente Médio, ainda não há sinais de um regime iraniano se desfazendo e o sistema em Teerã buscará, com o tempo, se reagrupar e restabelecer o controle interno.

Na minha opinião, no entanto, é mais provável que os Estados Unidos impeçam o Irã de tentar reconstituir seu programa nuclear, ajudem a garantir um cessar-fogo em Gaza e abram caminho para uma expansão dos Acordos de Abraão ao longo do tempo (anos, não meses).

Uma autoridade do Oriente Médio que conheci e em quem confio há muitos anos descreveu este período recente e a degradação do poder do Irã como a criação das condições para um novo Oriente Médio: mais estável, próspero, integrado e seguro.

Sua pergunta era se o governo Trump está comprometido em dar continuidade ao que foi possível, buscando a diplomacia com a mesma disciplina e habilidade vistas na fase militar.

Todos devemos torcer e encorajar que a resposta seja sim.

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