Na academia, é comum ver olhares enviesados quando alguém está usando pesos mais leves, como se isso fosse sinônimo de fraqueza ou de “treino fofo”. Mas essa ideia está longe da realidade. Começar ou retomar a musculação com cargas moderadas é uma estratégia fisiológica inteligente.
Segundo o fisioterapeuta Hyago Bhenner, dos hospitais Home, Santa Marta e Anchieta, de Brasília, o corpo precisa passar por um período de adaptação para que os músculos, articulações e sistema neuromotor consigam lidar com os estímulos da musculação de forma segura e eficiente.
“É fundamental respeitar o tempo de adaptação do corpo. O uso de cargas adequadas — nem muito leves, nem excessivas — permite que o sistema musculoesquelético se fortaleça de forma segura”, afirma o especialista. Quando esse processo é ignorado e a pessoa força além do que o corpo suporta, os riscos são altos. “Cargas muito pesadas podem causar lesões como distensões musculares, ruptura de fibras e sobrecarga nas articulações”, alerta Hyago.
A lógica por trás disso é simples: antes de aumentar a carga, é preciso construir uma base sólida de força, técnica e controle motor. O fisioterapeuta explica que o treino de força gera pequenas lesões nas fibras musculares que, durante o descanso, são reparadas (processo que deixa o músculo mais resistente).
“Esse processo exige tempo e persistência. A progressão de carga só deve acontecer conforme o corpo demonstra que está adaptado”, explica.
Um caso de uso indevido de excessivo de peso viralizou nas redes sociais no fim de junho. Um jovem quebrou as duas pernas e deslocou o pé enquanto usava a máquina de agachamento Smith. O caso ocorreu em Campo Largo, na região metropolitana de Curitiba
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Quem também reforça essa ideia é o educador físico Fernando Castro. Para ele, comparar o treino de iniciantes com o de pessoas mais experientes é um erro comum. “ O peso que cada pessoa levanta na academia é totalmente relativo e depende de vários fatores fisiológicos, como o nível de treinamento, massa muscular e até condição de saúde”, afirma.
Por isso, não importa se o colega do lado está levantando o triplo, o importante é respeitar o estágio e trabalhar dentro do que o seu corpo suporta naquele momento.
Exercícios que fortalecem os ossos e os músculos são essenciais para evitar doenças e demais problemas de saúde. Além de melhorar o equilíbrio, exercitar-se ao menos duas vezes por semana é um dos segredos para prolongar a expectativa de vida e envelhecer melhor
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Um estudo feito por pesquisadores da Universidade de Tohoku, no Japão, mostra que entre 30 e 60 minutos de exercícios de fortalecimento muscular por semana é o suficiente
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De acordo com os resultados da pesquisa, o risco de morte prematura entre as pessoas que se movimentam é entre 10% e 17% menor do que o verificado em pessoas sedentárias
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Exercícios que utilizam o peso do próprio corpo, como a musculação e a prática de esportes, são algumas das recomendações. Além disso, atividades como Tai chi e ioga são indicadas para fortalecer ossos e músculos
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Manter o corpo ativo ajuda ainda a melhorar resultados da menopausa, de períodos pós-operatório e pode ajudar a prevenir fraturas nos ossos, por exemplo. Além disso, auxilia no aumento da energia, e melhora o humor e o sono
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Segundo especialistas, pessoas que se exercitam por, ao menos, meia hora na semana demonstram redução do risco de morte, doenças cardíacas e câncer. Uma hora semanal de atividades de fortalecimento muscular também foi relacionada à diminuição do risco de diabetes
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A massa muscular e óssea do corpo humano atinge o pico antes dos 30 anos. A partir dessa idade, começa um decaimento natural, ou seja, indivíduos que começam a se exercitar na juventude terão aumento da força óssea e muscular ao longo da vida
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Pessoas que se exercitam depois dos 30 anos reduzem a queda natural do corpo, conseguem preservar a força óssea e muscular e vivem muito melhor
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Fernando lembra que o progresso na musculação ocorre quando o músculo é desafiado de forma gradual e dentro da capacidade individual. “O que determina a eficiência do treino não é o peso absoluto, mas sim a intensidade relativa ao que cada corpo consegue suportar”, resume.
Isso significa que um treino com menos carga pode ser tão ou mais eficiente do que um com pesos altos, desde que seja feito com boa técnica, controle e intenção.
Essa percepção é reforçada pelo ortopedista Pedro Ribeiro, da Unique ortopedia Brasília. Ele destaca pesquisas recentes que mostram como a execução correta do movimento, com boa amplitude e controle, é mais eficaz para a hipertrofia do que levantar cargas pesadas de forma limitada.
“Fazer o exercício com menos peso e a amplitude correta gera mais estímulo muscular do que usar muita carga e reduzir o movimento”, explica. Segundo ele, o peso deve ser um processo gradual, não o foco principal. O que importa é o estímulo certo, no momento oportuno.
Musculação com consciência corporal
Além da força física, o início da musculação exige consciência corporal. “O controle motor permite que a pessoa perceba como o corpo está se movimentando, mantendo a postura correta e prevenindo lesões”, diz Hyago. Para ele, a base de um treino seguro está mais em saber como o corpo se comporta do que na quantidade de peso levantado.
Por fim, tanto Fernando quanto Hyago reforçam que músculos mais fracos não significam necessariamente sedentarismo ou fraqueza. Há diversos fatores, como idade, doenças neuromusculares ou até deficiências nutricionais.
“Devemos considerar o contexto individual antes de associar a fraqueza unicamente à falta de atividade física”, conclui o fisioterapeuta.
O recado é claro: mais importante do que pegar pesado é treinar com consciência, respeitando os limites e a evolução do próprio corpo. O peso é só um meio. O objetivo é o progresso, e esse sim, deve ser constante e seguro.
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Fonte: Metrópoles