Um estudo do Banco Central (BC) identificou aumento do endividamento entre trabalhadores que contrataram o novo consignado privado, conhecido como consignado CLT, nos primeiros meses de concessões de crédito. Segundo a autoridade monetária, esse resultado sugere papel limitado da substituição de dívidas existentes na média desse grupo.
Houve um aumento médio de 58% no endividamento no mês da contratação do crédito. O montante que era de R$ 18,4 bilhões em fevereiro (antes da nova modalidade) passou para R$ 33,1 bilhões em julho, uma alta de R$ 14,7 bilhões.
A expansão do endividamento dos trabalhadores chega a superar o montante concedido no consignado CLT, de R$ 13,6 bilhões. De acordo com o BC, esse comportamento sugere a tomada de crédito em outras modalidades além do consignado.
6 imagens
Fechar modal.
1 de 6
Igo Estrela/Metrópoles2 de 6
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)
Raimundo Sampaio/Esp. Metrópoles3 de 6
Carteira de Trabalho
Wey Alves/Metrópoles4 de 6
Felipe Menezes/Metrópoles5 de 6
Regime de trabalho CLT é contestado por muitos jovens
Rafaela Felicciano/Metrópoles6 de 6
Felipe Menezes/Metrópoles
Também foi observada uma pequena redução no endividamento em modalidades de alto custo, como cartão de crédito, cheque especial e crédito pessoal não consignado. O saldo recuou 3%, mas voltou a crescer nos meses seguintes.
Os dados fazem parte de um boxe presente no Relatório de Política Monetária (RPM). Na pesquisa, o Banco Central verifica os efeitos da implementação do crédito consignado privado, iniciada em março.
Em entrevista coletiva para detalhar o relatório, o diretor de Política Econômica do Banco Central, Diogo Guillen, disse que “ainda é cedo para ter uma conclusão definitiva” sobre o aumento do endividamento.
“O tomador desse novo crédito é um trabalhador com menor instrução e renda, menos tempo de empresa e trabalhando em empresas de menor porte. As pessoas gostam de fazer comparação no número cheio, mas é importante olhar o perfil do tomador, sugerindo que talvez o perfil ajude a explicar a taxa de juros mais elevada”, ponderou Guillen.
Consignado CLT
- O Crédito do Trabalhador, ou consignado CLT, é um programa do governo federal que visa facilitar o acesso ao crédito para pessoas no setor privado, com taxas de juros menores que as usuais.
- Ele permite que trabalhadores celetistas, domésticos, rurais, empregados de MEI e diretores não empregados com direito ao FGTS solicitem crédito em instituições financeiras habilitadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
- Os trabalhadores podem trocar dívidas caras, como empréstimos pessoais sem garantia (CDC), carnê de pagamento das financeiras, o rotativo do cartão e o cheque especial, por um crédito com juros mais baixos.
- A expectativa é que, em 4 anos, 25 milhões de pessoas sejam incluídas no consignado privado.
- Ao requerer um empréstimo, o trabalhador terá que autorizar o acesso a dados pessoais (nome, CPF, margem do salário disponível para consignação e tempo de empresa), seguindo a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
- As parcelas serão descontadas mês a mês na folha do trabalhador, o que reduz a chance de inadimplência. O desconto ocorre por meio do eSocial, limitando-se à margem de 35% do salário.
BC diz que é cedo para avaliar impacto
Apesar da alta no endividamento, o BC ressalta que os resultados são “um retrato do ocorrido até o momento” e não devem ser extrapolados e interpretados como previsões dos efeitos mais amplos do programa no longo prazo.
Leia também
-
Vídeo: secretário diz que consignado CLT impactará pouco a inflação
-
Consignado CLT: portabilidade e refinanciamento têm novas datas. Veja
-
Senado aprova MP do crédito consignado para CLT e texto vai à sanção
-
Copom discutiu sobre consignado CLT, mas efeito do programa é incerto
O BC também recomenda cautela na interpretação dos resultados em “termos de causa e efeito”, ao levantar duas hipóteses: a oferta de uma nova modalidade de crédito pode elevar o endividamento, especialmente se for mais barata do que as anteriores; ou o fato de os contratantes, desde o início, estarem inclinados a ampliar o próprio endividamento.
“Nesse cenário, o consignado teria apenas viabilizado esse movimento, possivelmente, de forma mais barata, gerando menor serviço de dívida, com efeito benéfico no orçamento das famílias”, expõe.
Assim, a autoridade monetária avalia que ainda é preciso “um tempo maior” para medir o impacto dessas operações nas finanças dos tomadores. No entanto, “os resultados nos primeiros meses mostram, além do aumento das operações do crédito consignado privado, elevação no endividamento agregado em magnitude próxima à das concessões”.
Concessões e taxas
Entre março e julho 3 milhões tomaram algum tipo de crédito consignado privado, sendo 2,3 milhões contratados na nova modalidade. As concessões somaram R$ 21,9 bilhões no período, dos quais R$ 13,6 bilhões são apenas do consignado CLT.
Conforme o Banco Central, as operações do consignado CLT se mostraram mais caras do que os empréstimos consignados dos convênios, contudo, são bem mais baratas do que o crédito pessoal não consignado.
No caso das taxas de juros, a média do novo consignado atingiu 58% ao ano (ou 3,9% ao mês) até o final de julho, cerca de 60% da taxa de 106% ao ano (6,2% ao mês) cobrada no crédito pessoal não consignado. No mesmo período, a taxa média do consignado em contratos existentes antes de março chegou a 36,2% ao ano (2,6% ao mês).
O que diz o MTE
Procurado pelo Metrópoles, o Ministério do Trabalho e Emprego disse que não pode comentar uma pesquisa do Banco Central, “pois não temos acesso a essa pesquisa”. Vale lembrar que o boxe do BC é de acesso público.
Em trecho da nota, o MTE listou as ações promovidas pelo Crédito do Trabalhador. Conforme a pasta, “o programa identificou que houve troca de dívidas mais caras por operações mais baratas do crédito do trabalhador”.
Desde o começo da nova modalidade, o ministério contabilizou que 5,7 milhões de pessoas trocaram o crédito pessoal, com juros de 11% ao mês, pelo consignado privado, com juros médios de 3,3% ao mês.
“Ou seja, o Crédito do Trabalhador oportuniza o acesso ao crédito para os trabalhadores que ganham menos, e não ficam refém de um crédito pessoal com juros altos, do rotativo do cartão de crédito ou do agiota.
Fonte: Metrópoles