Um mês de tarifaço: impacto é sentido da indústria e ao bolso do consumidor

Exatos 31 dias atrás, uma canetada da Casa Branca mudou a realidade de mais de metade da pauta exportadora brasileira.

A partir do dia 6 de agosto, a conjuntura cedeu à seguinte lógica: uma parte das mercadorias brasileiras direcionadas aos Estados Unidos começou a ter que pagar uma tarifa de 50% para ocupar espaço nas prateleiras americanas. A medida firmou um aumento de 40 pontos percentuais à alíquota de 10%, em vigor desde abril.

Se a lista de quase 700 exceções à sobretaxa tornou-se motivo de alívio para alguns, é na regra que mora a angústia dos setores de café, carne, madeira, pescados, frutas, alumínio e outros congêneres afetados.

A sobretaxa impossibilitou as exportações destas indústrias à terra do Tio Sam — que era, até então, principal parceiro comercial da maioria.

Dados da balança comercial atualizados pelo Mdic (Ministério de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços) mostram que as vendas aos EUA caíram 18,5% em agosto de 2025, mediante comparação anual.

Em um mês da nova ordem mercantilista, dados e especialistas consultados pela CNN mostram: o aumento da taxação é inversamente proporcional à confiança das indústrias e ao preço de seus produtos no mercado nacional. O futuro, contudo, segue incerto. Confira.

Resignados a prateleiras tropicais

Quando há uma interrupção abrupta da exportação de qualquer produto, das duas, uma: ou os estoques encontram escoamento a outros mercados, ou a produção é redirecionada ao mercado nacional.

O Brasil já flerta com novos pretendentes. No começo de agosto, uma comitiva do governo foi ao Japão com o propósito de abrir o mercado de carne bovina. Já no finalzinho do mês, um sorridente Geraldo Alckmin (PSB) liderou uma missão de estreitamento de laços comerciais ao México, que assumiu, no mês, a segunda posição no ranking dos importadores de carne do Brasil.

A China, por sua vez, já sinalizou abertura ao mercado a café, gergelim e farinha de aves e suínos advindos dos trópicos. Minério de ferro, idem.

Apesar disso, “novos mercados envolvem um tipo de negociação que não acontece no curtíssimo prazo”, explica Robson Gonçalves, economista e professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas).

“Por enquanto, a solução é voltar a produção ao mercado interno. E, por conta da desaceleração da economia, a única forma de fazê-lo é pela queda de preços”, adiciona.

Um levantamento feito pela Scanntech com base em 13,5 bilhões de tíquetes de compra registrou o movimento: entre julho e agosto, o frango registrou retração de preços, com queda de 5,7% (R$ 17,33/kg).

O café teve queda de 4,6% (R$ 76,40/kg); a carne suína, 1,3% (R$ 23,05/kg); e a bovina, 0,8% (R$ 34,58/kg).

Marcos Matos, diretor-geral da Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil), explica a cascata de acontecimentos: a volatilidade das cotações, fruto das tarifas ao Brasil e outros exportadores importantes como Nicarágua, Venezuela e Vientã, fez subir o preço no mercado internacional.

Somado ao valor elevado, a sobretaxa de 50% matou a competitividade do grão brasileiro: que voltou, resignado, às xícaras brasileiras. Movimentos similares aconteceram com outros produtos afetados.

Para Gonçalves, da FGV, no caso do café e da proteína, os preços já estavam salgados no mercado nacional.

No ano, por exemplo, o grão registra uma alta de 41,46%. Em 12 meses, a porcentagem é ainda mais significativa: 70,51%. Levando em conta as mercadorias registradas pelo índice do IBGE, o produto, de longe, é o que mais subiu no período.

“Os preços tinham gordura para queimar. Há margem para redução sem necessariamente desorganizar estes dois setores”, afirma o economista.

O único setor que contrariou esta tendência foi dos pescados: no período, a alta foi de 2% (R$ 34,43/kg), segundo o levantamento da Scanntech.

“O aumento da oferta interna começa a pressionar os preços no varejo brasileiro. O consumidor sente alívio no curto prazo, mas isso gera uma preocupação em cadeia para produtores e indústrias”, afirmou Thomaz Machado, CEO da Scanntech, companhia que fez o levantamento.

Eduardo Lobo, presidente da Abipesca (Associação Brasileira das Indústrias de Pescado), explica que o setor conseguiu “realocar parte da produção e segurar outra. Como no segundo semestre há uma notório aumento na demanda do produto no Brasil, isso explica o aumento registrado”.

Contaminado de pessimismo

A preocupação também é medida em dados. Segundo informações da CNI (Confederação Nacional da Indústria), compiladas no início de agosto, a confiança da indústria exportadora no Brasil caiu significativamente nos últimos dois meses.

Entre junho e agosto, o ICEI (Índice de Confiança do Empresário Industrial) do setor caiu de 50,2 pontos para 45,6 pontos.

O índice varia de 0 a 100: valores acima de 50 indicam confiança; abaixo, falta dela. Isso significa que os empresários deixaram de confiar no setor depois dos acontecimentos recentes.

“As taxas de juros elevadas penalizam o consumo dentro do país. Mas as empresas exportadoras, com a opção de vender para o exterior, contornavam a queda da demanda no mercado doméstico”, explicou Marcelo Azevedo, gerente de Análise Econômica da CNI. Com o tarifaço, naturalmente, esse cenário mudou.

A CNI também apontou, na pesquisa, um movimento de queda no Índice de Expectativas, que mede o grau de confiança dos empresários quanto ao futuro da economia e dos próprios negócios nos próximos seis meses.

O indicador caiu 5 pontos no período: de 52,2 pontos para 47,2. Também houve migração do otimismo ao pessimismo.

Luz no horizonte longínquo

Marcos, da Cecafé, resume bem o sentimento das associações neste mesversário: incerteza.

Ele respondeu à CNN diretamente de terras norte-americanas: a organização faz parte de uma comitiva empresarial com 141 empresas e entidades, liderada pela CNI, que está em Washington na última semana tentando reverter o tarifaço. Muitas não responderam à reportagem, inclusive, devido à ferrenha agenda de tratativas.

“Frente às questões políticas, a missão empresarial tenta separar essa pauta e focar no econômico e técnico. É muito importante tentarmos a construção de pontes junto ao governo”, finaliza.

Robson argumenta ainda que o republicano opera em modelo “definitivo-provisório”. “Casos como da China, Índia e até do próprio Brasil, com todas suas exceções, mostram que nada é cravado em pedra”, diz. 

No curto prazo, segundo os especialistas, os preços devem continuar em tendência de queda. A depender do rearranjo da ordem mundial, outros parceiros comerciais podem ajudar a escoar esta produção e estabilizar a balança comercial brasileira.

Também há a chance de alguns produtos brasileiros serem aceitos por consumidores dos EUA apesar dos valores exorbitantes (em entrevista na semana passada, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que as importações de carne brasileira ao país haviam subido — sinal de que os compradores absorveram o aumento causado pelas tarifas).

Mas, apesar das infinitas e variáveis possibilidades, o professor Robson, da FGV, vê luz no horizonte longínquo. “Isso faz parte de um processo de dinamização do mercado brasileiro. É uma movimentação que o Brasil deveria ter feito 30 anos atrás”, argumenta.

“Talvez nossas carnes, pescados, frutas e derivados possam encontrar novos mercados. Se conseguirmos resistir ao longo de dois anos, o saldo pode ser bastante positivo.”

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