A reconstrução da mama, para muitas mulheres, simboliza o recomeço após o diagnóstico e o tratamento do câncer. Parte essencial do cuidado oncológico, o procedimento contribui para a recuperação física, emocional e psicológica, permitindo que o tratamento envolva não só a cura da doença, mas também a restauração da integridade e da feminilidade.
Segundo Fernanda Barbosa, mastologista do Hospital Sírio-Libanês, cuidar da mama é também cuidar da mulher como um todo. Por isso, sempre que possível, o procedimento é realizado no mesmo tempo da cirurgia oncológica — a chamada reconstrução imediata. Essa abordagem evita a sensação de perda e preserva o contorno corporal, ajudando a reduzir o impacto emocional do diagnóstico.
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Momento certo: o que define o tempo da reconstrução
A decisão de reconstruir a mama depende de fatores clínicos e emocionais. Quando o quadro de saúde permite, a reconstrução é feita logo após a retirada do tumor. Essa escolha, além de trazer melhores resultados estéticos, evita um segundo procedimento e acelera o processo de recuperação da paciente.
Há casos, porém, em que a reconstrução precisa ser adiada — por exemplo, quando a mulher está fragilizada ou precisará passar por radioterapia. Nesses casos, o procedimento é reavaliado posteriormente, sem que isso comprometa o tratamento.
Como é feita a reconstrução da mama
Existem diferentes caminhos cirúrgicos para reconstruir a mama, e cada um é escolhido conforme o tipo de câncer, a extensão da cirurgia e o perfil da mulher.
Segundo Wilson Cintra, coordenador do Núcleo Avançado de Cirurgia Plástica do Hospital Sírio-Libanês, as técnicas mais comuns são divididas em duas: com implantes de silicone ou expansores, e com tecidos do próprio corpo, chamados de retalhos.
Quando há pele e tecido suficientes, o implante pode ser colocado imediatamente. Em outros casos, é usado um expansor — uma espécie de prótese temporária que é preenchida aos poucos, até atingir o volume ideal para a colocação da prótese definitiva.
“Já a reconstrução com tecidos do próprio corpo utiliza pele, gordura e músculos de outras regiões, como abdômen ou costas, o que resulta em aparência e textura mais naturais”, afirma.
Avanços que transformam o olhar sobre o câncer
A mastologista Mariana Fiori, do Hospital Santa Lúcia Norte, em Brasília, lembra que, há poucas décadas, as cirurgias para o câncer de mama eram mais agressivas e mutiladoras. Hoje, a medicina evoluiu — e, com ela, a forma de olhar para o corpo feminino.
“Com técnicas menos invasivas, é possível preservar pele, aréola e até o mamilo em muitos casos, o que resulta em resultados mais harmônicos”, diz Fiori.
Além da transformação física, há um profundo impacto emocional. Segundo a médica, mulheres reconstruídas relatam maior satisfação com o corpo, melhora da imagem corporal e redução de sintomas de ansiedade e depressão.
“A reconstrução, portanto, não é apenas uma questão de aparência. É uma forma de preservar o equilíbrio mental e emocional, tão importante quanto o próprio tratamento oncológico”, conclui.
Reconstrução é um direito garantido por lei
Toda mulher submetida à retirada parcial ou total da mama tem direito legal à reconstrução mamária, seja na rede pública, seja na privada. Segundo Patrícia Schorn, especialista em câncer de mama e membro titular da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece todas as técnicas disponíveis, desde que a unidade conte com equipe habilitada.
“Em alguns casos, mulheres escolhem retirar também a mama saudável — especialmente quando há mutações genéticas que elevam o risco de câncer, como BRCA1 e BRCA2. É uma escolha legítima e respeitada, pois cada paciente tem uma história e uma expectativa em relação à própria vida”, explica Schorn.
O câncer pode voltar após a reconstrução?
Uma das dúvidas mais frequentes é se o câncer pode voltar em uma mama reconstruída. A resposta é sim, mas o risco é baixo — e a reconstrução não interfere na detecção de uma possível recidiva.
Os exames de imagem, como mamografia, ultrassom e ressonância, continuam sendo eficazes e seguros. O importante é manter o acompanhamento periódico com o mastologista, que conhece o histórico da cirurgia e sabe diferenciar alterações benignas, como cicatrizes, e sinais suspeitos.
“A reconstrução não é um disfarce. É uma continuação do cuidado”, resume a mastologista Fernanda Barbosa.
Como toda cirurgia, a reconstrução envolve riscos. As complicações mais comuns são infecções, abertura de pontos e rejeição da prótese. Em casos mais raros, pode ocorrer necrose parcial do tecido ou perda do enxerto.
Condições como tabagismo, diabetes descontrolada ou doenças cardiovasculares aumentam as chances de complicações — por isso, a decisão deve ser individual e cuidadosamente avaliada.
De acordo com Mariana Fiori, o ponto principal é o equilíbrio entre benefício e risco. “A reconstrução é uma cirurgia reparadora, e não um procedimento estético. Ela deve ser feita dentro de um plano terapêutico seguro, sem comprometer o restante do tratamento oncológico”, ressalta.
Após o processo de reconstrução, é possível restaurar também a aréola e o mamilo, o que completa o aspecto natural da mama. Hoje, a técnica mais comum é a micropigmentação 3D, que reproduz com fidelidade a cor e o formato originais. Em alguns casos, também é possível reconstruir cirurgicamente a papila mamária ou transplantar parte do mamilo da mama saudável.
Segundo o cirurgião plástico e professor da Afya Unigranrio, Orido Pinheiro, esses detalhes têm forte valor simbólico. “A mulher volta a se reconhecer diante do espelho, e isso é parte essencial da cura”, diz.
A reconstrução mamária é mais do que uma cirurgia — é um gesto de amor-próprio. Representa a retomada da autoestima, a superação da dor e a reafirmação da feminilidade após uma das experiências mais desafiadoras da vida.
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Fonte: Metrópoles