Nas terras áridas do leste de Wyoming, nos Estados Unidos, a Formação Lance é um tesouro de fósseis pré-históricos. Uma região em particular — com menos de 10 quilômetros de extensão — forneceu aos cientistas pelo menos meia dúzia de espécimes de dinossauros extraordinariamente bem preservados, completos com detalhes de pele escamosa, cascos e espinhos.
O paleontólogo Paul Sereno e seus colegas a chamam de “zona das múmias” em um novo estudo que busca explicar por que esta área específica produziu tantas descobertas surpreendentes e definir exatamente o que é uma “múmia” de dinossauro.
No início dos anos 1900, um caçador de fósseis chamado Charles Sternberg encontrou dois espécimes de um grande dinossauro bico-de-pato, Edmontosaurus annectens, na Formação Lance. Os esqueletos estavam tão prístinos que Sternberg, junto com H.F. Osborn, um paleontólogo do Museu Americano de História Natural de Nova York, conseguiu distinguir o que pareciam ser grandes extensões de pele com escamas discerníveis e uma crista carnosa que aparentemente se estendia pelo pescoço do réptil.
Sereno, autor principal do estudo e professor de biologia organísmica e anatomia na Universidade de Chicago, descreveu a descoberta inicial como “a maior múmia de dinossauro — até talvez o juvenil que encontramos” em 2000.
Separadas por quase um século, a descoberta de Sereno e sua equipe compartilhava características comuns com a de Sternberg: os esqueletos foram preservados em poses tridimensionais e mostravam evidências claras de pele e outros atributos que normalmente não sobrevivem 66 milhões de anos no solo. “Osborn disse em 1912 que sabia que não era pele real desidratada, como nas múmias egípcias”, disse Sereno. “Mas o que era então?”
Seja lá o que fosse, “na verdade, não sabíamos como estava preservado”, disse ele. “Era um mistério.”
A nova pesquisa põe fim a esse mistério e pode ajudar paleontólogos a encontrar, reconhecer e analisar futuras descobertas de múmias em busca de pequenas pistas sobre a verdadeira aparência dos dinossauros gigantes.
Um dinossauro eternizado em argila

Sereno e seus colaboradores utilizaram tomografia computadorizada, imagens em 3D, microscopia eletrônica e espectroscopia de raios-X para analisar duas múmias de Edmontosaurus que descobriram na Formação Lance em 2000 e 2001 — um juvenil e um jovem adulto.
“Procuramos, procuramos e procuramos, fizemos amostragens e testes, e não encontramos nenhum” vestígio de tecido mole, disse Sereno.
O que a equipe encontrou, em vez disso, foi uma fina camada de argila, com menos de um centésimo de polegada de espessura, que se formou sobre a pele dos animais. “É tão realista que é inacreditável”, disse ele.
Enquanto Sternberg e Osborn se referiam à “impressão” da pele em seus espécimes, o artigo de Sereno propõe um termo alternativo — “renderização” — que ele argumenta ser mais preciso.
O estudo estabelece as condições que produziriam tal renderização. No Período Cretáceo Superior, quando o Edmontosaurus vagava pelo que é hoje o Oeste americano, o clima alternava entre secas e chuvas de monção.
Foi determinado que a seca foi a causa da morte da múmia original encontrada por Sternberg e descrita por Osborn, assim como de outros animais cujos fósseis foram encontrados nas proximidades. Assumindo que o mesmo ocorreu com os novos espécimes, as carcaças teriam secado ao sol em uma ou duas semanas.
Em seguida, uma enchente repentina enterrou os corpos em sedimentos. As carcaças em decomposição teriam sido cobertas por uma película de bactérias, que podem atrair eletrostaticamente a argila encontrada no sedimento ao redor. O revestimento ultrafino de argila permaneceu muito tempo após os tecidos subjacentes terem se decomposto completamente, mantendo sua morfologia detalhada e formando uma perfeita máscara de argila.
“Os minerais de argila têm a capacidade de atrair e aderir a superfícies biológicas, garantindo uma moldagem que pode reproduzir fielmente as superfícies mais externas de um corpo, como pele e outros tecidos moles”, disse Anthony Martin, professor do departamento de ciências ambientais da Universidade Emory em Atlanta, que não participou da pesquisa.
“Então faz sentido que essas argilas tenham formado retratos tão detalhados das escamas, espinhos e cascos dos dinossauros.”
Stephanie Drumheller-Horton, paleontóloga de vertebrados da Universidade do Tennessee, Knoxville, que não participou do estudo, é especialista em tafonomia, que ela descreveu como “o estudo de tudo que acontece com um organismo desde sua morte até o momento em que o encontramos.” Ela está particularmente interessada em como esses fósseis se formaram.
“As múmias de dinossauros são conhecidas há mais de cem anos, mas definitivamente houve mais ênfase em descrever sua pele e menos em entender como elas se fossilizaram em primeiro lugar”, disse ela por e-mail. “Se pudermos entender como e por que esses fósseis se formam, podemos direcionar melhor onde procurar para potencialmente encontrar mais deles.”
Um retrato detalhado de um dinossauro bico-de-pato
Juntas, as duas múmias descobertas mais recentemente permitiram que Sereno e sua equipe criassem uma atualização detalhada de como o Edmontosaurus provavelmente se parecia.
De acordo com suas análises, o dinossauro, que podia crescer até mais de 12 metros de comprimento, tinha uma crista carnuda ao longo do pescoço e das costas e uma fileira de espinhos descendo pela cauda. A pele da criatura era fina o suficiente para produzir rugas delicadas sobre a caixa torácica e era pontilhada com pequenas escamas semelhantes a seixos.
A máscara de argila revelou que o animal tinha cascos, uma característica anteriormente preservada apenas em mamíferos. Isso o torna o animal terrestre mais antigo comprovadamente com cascos e o primeiro exemplo conhecido de um réptil com cascos, disse Sereno. “Desculpe, mamíferos, vocês não inventaram isso”, brincou ele. “Suspeitávamos? Sim, suspeitávamos que tinha um casco pelas pegadas, mas ver é acreditar.”
O estudo foi publicado na quinta-feira na revista Science.
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