Por décadas, as terras raras permaneceram fora do debate público, restritas às páginas técnicas da geologia e da química.
Agora, estão no centro das atenções geopolíticas e econômicas depois que os Estados Unidos ameaçaram anexar territórios ricos nesses elementos, como a Groenlândia, e a China restringiu suas exportações – em uma resposta clara que mira a indústria americana de alta tecnologia.
Apesar do nome, as terras raras não são tão raras assim. Trata-se de um grupo de 17 elementos químicos, entre eles neodímio, praseodímio, disprósio, térbio e lantânio, encontrados em minerais como monazita e xenotímio.
O termo “raro” se refere ao processo de separação e refino, altamente complexo, poluente e caro, que exige tecnologia avançada e grande controle ambiental.
Esses elementos estão presentes em praticamente toda a tecnologia moderna: telas de celulares, computadores, turbinas eólicas, painéis solares, veículos elétricos, mísseis, radares e caças militares.
Eles são indispensáveis também na transição energética, usados na produção de imãs permanentes para motores elétricos e geradores, além de baterias de alta densidade.
As maiores reservas conhecidas de terras raras estão na China, Brasil, Vietnã, Rússia e Austrália, segundo dados do Serviço Geológico dos Estados Unidos.
Apesar de o recurso estar relativamente bem distribuído pelo planeta, a China domina quase toda a cadeia de produção — do refino à fabricação de componentes de alto valor agregado.
Atualmente, cerca de 60% da mineração global ocorre em território chinês. O dado mais preocupante, no entanto, está no processamento: 91% de todo o refino mundial é feito por empresas chinesas, que também produzem 94% dos imãs permanentes usados em turbinas, motores e equipamentos de defesa.
A IEA (Agência Internacional de Energia) classificou essa concentração como um risco geopolítico severo, alertando que o domínio chinês permite a Pequim influenciar preços, controlar o acesso de países concorrentes e definir o ritmo de avanço de tecnologias estratégicas, como semicondutores, veículos elétricos e sistemas de armazenamento de energia.
A recente decisão do governo chinês de restringir ainda mais as exportações desses elementos, agora incluindo produtos e componentes que contenham terras raras, gerou repercussões globais e acelerou a corrida do Ocidente por fontes alternativas.
Empresas da Austrália, Canadá e Estados Unidos já iniciaram movimentos para investir em mineração e refino fora da Ásia.
Para Washington, o tema é especialmente sensível: a supremacia militar e tecnológica dos EUA pode ser ameaçada se a China ampliar o controle sobre insumos essenciais a setores de defesa, inteligência artificial e energia limpa.
É nesse contexto que o Brasil ganha destaque.
O país detém a segunda maior reserva de terras raras do mundo, mas ainda produz e refina quase nada.
Não há um marco regulatório específico para o setor, e a cadeia produtiva é incipiente. Mesmo assim, empresas ocidentais já começaram a adquirir projetos e realizar pesquisas e mapeamentos geológicos em território nacional.
Paralelamente, o governo federal criou o Conselho Nacional de Política Mineral, responsável por formular diretrizes para a exploração sustentável e estratégica desses recursos.
Na Câmara dos Deputados, avança o debate sobre a Política Nacional de Minerais Críticos.
Mineradoras estrangeiras já enxergam o Brasil como um potencial “fornecedor seguro” de insumos estratégicos.
Um acordo para o fornecimento seguro de terras raras aos EUA poderia, inclusive, fazer parte de um eventual entendimento do Brasil com Donald Trump no contexto do tarifaço.
Um exemplo é a australiana Viridis Mining & Minerals, que anunciou a construção de um centro de pesquisa e processamento de terras raras em Poços de Caldas (MG), totalmente livre de tecnologia ou componentes chineses.
Segundo a empresa, o objetivo é consolidar o Projeto Colossus, no sul de Minas Gerais, como uma alternativa ocidental na cadeia global de minerais críticos.
Especialistas apontam que esse tipo de investimento privado é essencial para desenvolver a indústria nacional, dada a complexidade técnica e o custo bilionário das operações.
O governo, por sua vez, rejeita a ideia de que o Brasil se torne um mero exportador de matéria-prima.
A estratégia, segundo fontes do Ministério de Minas e Energia, é atrair transferência tecnológica e estimular a industrialização local, de modo que o país participe de forma mais ativa da economia verde e das cadeias globais de alto valor.
Minerais críticos podem elevar PIB do país em R$ 243 bi até 2050

