Desigualdade educacional entre negros persiste apesar de avanços

Na última década, foram registrados avanços consistentes no acesso e na permanência de estudantes negros em todos os níveis de ensino no Brasil, mas a desigualdade racial segue estruturada ao longo de toda a trajetória escolar.

É o que mostra pesquisa feita pelo Cedra (Centro de Estudos e Dados sobre Desigualdades Raciais), com base nos dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua).

O estudo reúne 31 indicadores inéditos sobre a evolução da escolaridade de pessoas negras no Brasil entre 2012 e 2023. Segundo o Cedra, políticas afirmativas, como a Lei de Cotas, contribuíram de forma decisiva para ampliar a presença de estudantes negros no ensino superior.

A taxa de conclusão universitária entre mulheres negras acima de 25 anos passou de 7,9% em 2012 para 14,9% em 2023. Entre homens negros, o índice subiu de 5,3% para 11,2%. Apesar do avanço, a distância em relação aos brancos aumentou no período: mulheres brancas chegaram a 30,3% e homens brancos a 25,9%.

A disparidade também aparece nas etapas anteriores. Em 2023, 33,2% das pessoas negras acima de 15 anos ainda estavam sem instrução ou com o fundamental incompleto — patamar semelhante ao observado entre brancos em 2012.

Embora a desigualdade tenha caído de 13,6 para 9,1 pontos percentuais na década, o índice permanece elevado: entre mulheres negras, 31,6% seguem nesse grupo; entre homens negros, 34,9%.

Segundo o Cedra, embora diversos indicadores tenham melhorado, o ritmo dos avanços é insuficiente para eliminar a desigualdade racial nas próximas décadas.

Em muitos casos, pessoas negras em 2023 atingem níveis de escolaridade equivalentes aos de pessoas brancas em 2012, o que evidencia a lentidão do processo de equiparação.

“Quando desdobramos os números, podemos entender como as questões raciais e de gênero incidem fortemente nas desigualdades”, afirma Cristina Lopes, diretora-executiva do Cedra.

Analfabetismo em queda

O analfabetismo também apresentou queda expressiva, especialmente em pessoas jovens. Entre negros de 15 a 29 anos, a taxa passou de 2,4% para 0,9% entre 2012 e 2023, enquanto entre brancos caiu de 1,1% para 0,6%. Ainda assim, entre mulheres negras acima de 15 anos, o índice é o dobro do registrado entre mulheres brancas (6,6% contra 3,3%).

“Os dados mostram a persistência da desigualdade. Os jovens negros com ensino médio incompleto estacionaram ao longo desses 11 anos”, afirma Cristina.

O professor Marcelo Tragtenberg, integrante do conselho deliberativo do Cedra, diz que o analfabetismo corresponde a quem “não sabe escrever um bilhete simples”, segundo medição do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Segundo ele, embora as taxas tenham recuado, permanece uma discrepância entre mulheres negras e brancas desde 2012. “A proporção de analfabetismo entre mulheres negras segue o dobro da registrada entre mulheres brancas.”

Tragtenberg prossegue ao comentar a queda. “Ainda há uma diferença expressiva. O analfabetismo é vencido mais rapidamente pelas brancas do que pelas negras — é uma disparidade.”

Entre homens negros, diz Tragtenberg, o quadro “é ainda pior”: a diferença entre negros e brancos diminuiu, mas não no mesmo ritmo observado entre as mulheres.

Tragtenberg destaca ainda um “recorte pouco observado”: a produção do analfabetismo na idade adulta. São pessoas que passaram pelo sistema educacional, mas saíram dele sem aprender a ler e escrever plenamente.

“Em 2023, essa taxa cai consideravelmente, mas ainda persiste uma desigualdade de um terço”, afirma. Tragtenberg lembra que entre pessoas brancas o analfabetismo também persiste, embora em níveis menores.

Entre jovens de 15 a 19 anos, houve redução acentuada nos índices de baixa escolaridade, segundo a pesquisa.

O percentual de homens negros com fundamental incompleto caiu de 40% para 21,3%; entre mulheres negras, de 29,6% para 15,7%. Mesmo com a melhora, os indicadores permanecem mais altos que os dos jovens brancos.

“Esse dado deve mudar ao longo dos anos com o impacto de uma política específica para esse grupo que é o Pé de Meia. Apesar de não ser uma política essencialmente racial, esse programa [do governo federal] pode beneficiar diretamente a população negra, historicamente mais prejudicada do ponto de vista econômico e social”, diz Cristina.

Ensino médio

No ensino médio e no acesso ao ensino superior, a distância praticamente não mudou. Em 2016, 26,4% dos jovens brancos de 18 a 24 anos frequentavam o ensino superior, ante 13% dos jovens negros. Em 2023, os percentuais foram 28,3% e 15,3%, respectivamente.

Entre idosos, a diferença é mais acentuada. Mais de um terço das pessoas negras com mais de 60 anos eram analfabetas em 2012. A taxa caiu de forma significativa ao longo da década, tanto entre negros quanto entre brancos — neste último grupo, a redução foi praticamente pela metade.

“Ainda assim, há espaço para avançar na educação e alfabetizar essa faixa etária”, diz Tragtenberg.

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