O Palácio do Planalto subiu o tom contra o relator do projeto antifacção na Câmara dos Deputados, Guilherme Derrite (PP-SP), e busca reverter pontos do texto antes da votação no plenário da Casa, prevista para esta terça-feira (11).
Uma das principais críticas de governistas é de que mudanças feitas por Derrite restringem o poder da Polícia Federal. A própria corporação afirma que as operações passariam a depender de pedidos aos governos estaduais, comprometendo o alcance e os resultados das investigações, por exemplo.
A ministra da Secretaria das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, chegou a classificar o texto modificado por Derrite como “um presente para as facções”.
Outro ponto de discórdia é que Derrite pode, na prática, equiparar facções a terrorismo, ponto expressamente rechaçado pelo governo.
Ainda de acordo com aliados do presidente Lula, o projeto modificado tem o potencial de blindar investigações contra parlamentares. Ou seja, servir como uma nova PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da blindagem, proposta arquivada pelo Senado após forte pressão popular.
Diante das resistências, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou que intermediou conversas entre Derrite e o diretor-geral da PF para que a instituição mantenha as atribuições contra o crime organizado.
Ainda assim, Gleisi disse que “não há e não haverá acordo que suprima as competências, atribuições e autonomia da Polícia Federal”. “Encaramos com preocupação qualquer manobra pra modificar o papel da PF no combate ao crime organizado.”
Motta pretende se reunir nesta terça com a ministra. Ele foi o responsável por designar Derrite como relator da proposta. Derrite é deputado licenciado e secretário de segurança pública do governador paulista de Tarcísio de Freitas (Republicanos) — potencial adversário de Lula nas urnas em 2026 –, mas voltou agora pra Câmara só para a tarefa.
Por isso, Motta tenta contar o clima de desconfiança do governo federal e garantir a votação do projeto antifacções no plenário.
A escolha de Motta por Derrite irritou aliados do Planalto, que veem na decisão um gesto político. Embora Motta mantenha boa relação com Lula, petistas avaliam que a nomeação de Derrite esvaziou a autoria do Executivo e transformou o debate sobre segurança pública em um embate eleitoral antecipado.
Também há um receio de que a relatoria de Derrite fortaleça as ambições eleitorais de Tarcísio para o ano que vem.
“Eu achei que foi muito deselegante, porque era uma proposta do Poder Executivo, era uma proposta do presidente Lula. É como se tirassem a autoria do presidente Lula”, afirmou o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ).
Derrite, por sua vez, afirmou à CNN que seu parecer será técnico e sem motivações políticas.
“Toda e qualquer vaidade institucional deve ser deixada de lado neste momento, e a gente vai promover uma legislação que promova realmente a integração entre os estados.”
Motta chegou a ser reunir nesta segunda-feira (10) com o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), e com o procurador-geral da República, Paulo Gonet, para discutir o assunto.
“Acabo de sair do Supremo Tribunal Federal, onde participei de uma reunião para discutir a pauta da Segurança Pública. Participaram o Vice-Presidente do STF, ministro Alexandre de Moraes, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e os 27 procuradores de estado do país. O momento é de união das instituições contra o crime organizado.”
Mais cedo, Moraes — relator da ação que trata da atuação de forças de segurança em favelas — determinou a preservação das imagens das câmeras corporais usadas na recente megaoperação no Rio de Janeiro e suspendeu investigações contra as pessoas que removeram corpos da área de mata.
Enquanto isso, no domingo (9), em cúpula de países latino-americanos e caribenhos junto à União Europeia, na Colômbia, Lula afirmou não haver “solução mágica para acabar com criminalidade”, e que a saída para o problema está em estrangular o financiamento do crime organizado e em eliminar o tráfico de armas.
No mesmo evento, sem citar os Estados Unidos, o presidente criticou o uso de força militar no mar do Caribe, onde os americanos têm abatido barcos supostamente de facções criminosas transportando drogas.
“Velhas manobras retóricas são recicladas para justificar intervenções ilegais. Somos uma região de paz e queremos permanecer em paz. Democracias não combatem o crime violando o direito internacional”, declarou.
