Desde que retornou à Casa Branca, Donald Trump usou as tarifas para mudar a correlação de forças no comércio global e tentar realizar intervenções políticas.
Ao anunciar – ou ameaçar – tarifar determinado país ou produto, o americano solicita que algum comportamento visto por ele como negativo seja corrigido. No entanto, a tática não surte efeito desejado por Trump, segundo afirmaram especialistas ao WW Especial.
“Sanções e tarifas podem produzir vitórias táticas quando há metas estreitas e coalizão ampla de países apoiando, mas como política de uso recorrente e maximalista, elas tendem a ser contraproducentes”, afirmou Marcello Estevão, diretor-gerente e economista-chefe do Instituto de Finanças Internacionais.
No caso do Brasil, Trump pediu a soltura de Jair Bolsonaro e que o governo não seguisse com a regulamentação das big techs. Desde então, Bolsonaro foi condenado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) e o Planalto tentou avançar com um projeto de regulação econômica das gigantes da tecnologia.
Para a China, Trump fez vários pedidos. O maior deles foi que os chineses reduzissem os controles contra a exportação de minerais raros, essenciais para a fabricação de chips e outros equipamentos.
A restrição de Pequim tinha vindo na esteira da guerra comercial do republicano. Por fim, ambos os países fizeram uma “trégua”, que reduziu o nível de taxas e retomou parcialmente a exportação do material.
O ex-secretário de Comércio Exterior do Brasil Lucas Ferraz aponta que a estratégia de ofensiva tarifária tende a funcionar com países pequenos, mas empaca com grandes economias.
“Quando você fala de sanções em economias nessa grandeza, os resultados tendem a ser muito ruins”, apontou ao WW.
O professor de Relações Internacionais da FGV e de Economia da Faap Vinicius Rodrigues Vieira vê “um ato desesperado por parte dos EUA para controlar a ascensão chinesa”. No entanto, ainda de acordo com o professor, os “instrumentos são muito fracos diante da capacidade chinesa de produzir novas tecnologias.”
As intimidações da guerra comercial começaram antes mesmo do republicano tomar posse, seguindo ao longo dos meses. Trump ameaçou tarifar e abrir investigações comerciais contra outros países ou blocos econômicos pelo menos 37 vezes, segundo o think-tank Atlantic Council.
Uma parte delas não foi para frente, um outro componente de incerteza para os mercados internacionais. Mesmo assim, a alíquota média dos EUA chegou ao maior valor desde 1934, de 17,9%. Nenhum país escapou das tarifas de Trump, com os mais afetados sendo Brasil, China e Índia.
Os efeitos dos tarifaços chegam aos consumidores na inflação e no mercado de trabalho. O preço da carne, por exemplo, cresceu mais de 8% e do café quase 19%. No emprego, o setor produtivo é o mais afetado, com queda nos números de postos de trabalho desde o “Dia da Libertação” em abril.
Fonseca explica que até fevereiro os EUA estavam tendo deflação e, por efeito das tarifas, “agora é positivo”.
“Em algum momento a conta vai chegar, já está chegando principalmente ao consumidor americano e, sobretudo, aos trabalhadores americanos que deram voto de confiança em Trump para que ele reindustrialize a América”, pontuou Vinicius.
Esses fatores resultaram em uma queda de popularidade do presidente americano, segundo pesquisa da CNN. Trump atingiu os 37% de aprovação, o menor valor do segundo mandato, e viu a insatisfação da população com os rumos do país crescer para 68%.
A Casa Branca também viu a oposição garantir vitórias importantes em eleições na última semana. O partido Democrata venceu os pleitos na prefeitura de Nova York e nos governos dos estados de Virgínia e Nova Jersey.
No ano que vem, os americanos retornam às urnas para as eleições legislativas que renovam metade da Câmara e do Senado – as chamadas midterms.
Vinicius explica que se Trump não melhorar a situação econômica do país, “2026 será de uma derrota acachapante para o partido Republicano.”
“Nós temos uma situação em que será possível mensurar se de fato temos a paciência do eleitor americano segurando a Trump uma nova chance de seguir o segundo mandato de forma estável”, conclui Vinicius.

