A combinação de um microchip implantado sob a retina e um par de óculos inteligentes conectados foi capaz de devolver parte da visão a pessoas com degeneração macular relacionada à idade (DMRI) avançada. O estudo, feito por pesquisadores de cinco países, permitiu que 81% dos voluntários melhorassem a capacidade de leitura após 12 meses.
Publicada no The New England Journal of Medicine no final de outubro, a pesquisa detalha como a conexão entre os dispositivos tecnológicos devolveu ao organismo a capacidade de decodificar os estímulos luminosos sem depender diretamente das células danificadas pela doença.
“Apesar desse implante não estar disponível imediatamente para os pacientes, ele é realmente um avanço muito importante”, afirma o oftalmologista e retinólogo Diego Monteiro Verginassi, do Einstein Hospital Israelita.
A tecnologia utiliza um implante fotovoltaico colocado por baixo da retina, a parede interna do olho que recebe os sinais da luz. Esses sinais são enviados por uma câmera acoplada aos óculos inteligentes. A câmera capta imagens e as transforma em feixes de luz infravermelha, projetados sobre o chip. Este, por sua vez, converte a luz em estímulos elétricos, assim como faria a retina se não estivesse doente, enviando sinais visuais ao cérebro.
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Dos 32 voluntários que completaram o acompanhamento de um ano da pesquisa, 27 tiveram avanços no teste de leitura. “Nesse estudo, a maioria dos pacientes conseguiu melhorar o que chamamos de linhas de visão. Quando vamos a um oftalmologista, nós projetamos linhas de letras maiores que progressivamente vão ficando cada vez menores. Nesses casos, os pacientes conseguiram ler de cinco a 12 linhas menores do que aquilo que eles conseguiam ler antes do implante do microchip”, explica Verginassi.
O implante se carrega com a luz infravermelha projetada pelos óculos, portanto, não precisa de fios ou baterias para funcionar. Além disso, o dispositivo não prejudicou o funcionamento da visão periférica natural dos pacientes que ainda a preservavam, com as duas formas (a artificial e a orgânica) atuando simultaneamente.
Mas a cirurgia para colocar o pequeno chip de 2 milímetros sob a retina não é simples. “Hoje já é um tipo de cirurgia que fazemos na prática, para tratar hemorragias ou até transplantes de epitélio pigmentar, porém é um procedimento complexo”, relata o oftalmologista.
Foram registrados 26 eventos adversos graves em 19 participantes, sendo que quase todos estavam relacionados ao aumento de pressão no olho e a pequenas hemorragias nas primeiras oito semanas após a cirurgia. Nenhum caso resultou em perda total de visão ou risco sistêmico.
Os pesquisadores agora trabalham em protótipos que possam dar maior nitidez à visão e planejam aumentar o número de voluntários submetidos aos testes, mas ainda deve demorar até que essa alternativa possa ser usada pelo público geral.
Chip tenta resolver perda da visão central
A DMRI é a principal causa de cegueira irreversível no mundo. A doença destrói progressivamente as células receptoras de luz na retina, afetando especialmente o centro da visão.
“Nessa região temos uma estrutura chamada mácula, que tem uma alta concentração de células que fazem a tradução da luz em impulso nervoso. Na DMRI, essas células sofrem alterações e param de funcionar, causando a perda da visão central que vai aumentando progressivamente em uma cegueira irreversível”, detalha o médico do Einstein.
A doença se apresenta de duas formas principais: a seca e a úmida. A seca representa a maioria dos casos e ainda carece de terapias eficazes. “As opções se limitam ao uso de vitaminas e terapias com luz, mas os resultados são pouco animadores”, afirma Verginassi.
Já a forma úmida, também chamada neovascular, é tratada com injeções intraoculares de medicamentos que evitam sangramentos responsáveis por danificar as células receptoras de luz. Mesmo com esse tratamento, só é possível conter a progressão da doença, e não restaurar a visão. E isso é justamente o que promete o chip em estudo.
“Obviamente, ainda não falamos em recuperar a leitura plena, mas é um avanço importante ao desbravar um tipo de tecnologia até então inatingível”, conclui Diego Verginassi.
Fonte: Metrópoles
