Mais de dois meses depois de Israel e o Hamas terem concordado com uma trégua na guerra em Gaza, a maior parte dos combates foi interrompida.
No entanto, ambos os lados trocam acusações de violações graves do acordo e não parecem estar mais perto de aceitar as condições previstas para a próxima fase do acordo.
O que foi acordado?
As etapas do cessar-fogo são descritas em três documentos diferentes. O mais detalhado é um plano de 20 pontos apresentado pelo presidente dos EUA, Donald Trump, em setembro, para uma trégua inicial, seguida de medidas para uma paz duradoura.
Em última análise, o plano pede que o Hamas abandone suas armas e não tenha qualquer papel de governo em Gaza. O texto também pede que Israel se retire do território palestino. No entanto, Israel e Hamas não concordaram com todos os pontos do acordo.
Em 9 de outubro, Israel e o Hamas assinaram um acordo de cessar-fogo mais limitado, envolvendo apenas as primeiras partes do plano de Trump – a libertação de reféns israelenses e prisioneiros palestinos, a suspensão da guerra, a retirada parcial de Israel e um aumento na ajuda humanitária.
O plano de Trump foi então aprovado por um terceiro documento, uma resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas que também autorizou a criação de um governo de transição e uma força de estabilização internacional em Gaza.
Como tem funcionado?
Todos os 20 reféns vivos foram liberados, assim como centenas de prisioneiros palestinos. A liberação dos corpos de reféns mortos demorou mais: um deles continua em Gaza e outros 27 foram devolvidos.
Há uma disputa sobre a entrega de ajuda humanitária: o Hamas diz que o número de caminhões entrando em Gaza com suprimentos é menor do que o acordado. As agências humanitárias também dizem que há muito menos ajuda do que necessário e que Israel está bloqueando a entrada de muitos itens.
Israel nega as acusações e diz que está a cumprindo as suas obrigações com a trégua.
A passagem de Rafah, na fronteira com o Egito, deveria ser aberta na primeira fase do cessar-fogo, mas permanece fechada. Israel disse que a travessia só será aberta para que palestinos entrem e saiam de Gaza quando o corpo do último refém for devolvido.
Gaza continua em ruínas, com os moradores retirando utensílios dos escombros para construir tendas.
A Fundo das Nações Unidas para a Infância, o Unicef, disse neste mês que um número “chocantemente elevado” de crianças de Gaza ainda está gravemente desnutrido, enquanto fortes chuvas inundaram milhares de tendas e levaram esgoto e lixo por todo o território, agravando a crise de saúde.
Ainda há resquícios de violência. Combatentes palestinos lançaram ataques contra as forças israelenses em Gaza, matando pelo menos três. Já os disparos israelenses contra pessoas perto da linha de demarcação, durante operações de Israel contra o Hamas, mataram cerca de 400 palestinos, segundo autoridades de saúde de Gaza.
Quais assuntos ainda não foram acordados?
Uma força de estabilização internacional deveria garantir a segurança e a paz dentro de Gaza, mas ainda não está claro por quem ela será composta e por quanto tempo vai operar. A Indonésia e o Paquistão podem desempenhar um papel na estabilização. Israel quer que qualquer força desse tipo desarme o Hamas, uma tarefa que poucos países se dispuseram a completar.
Um órgão palestino tecnocrata sem representação do Hamas deverá governar durante um período de transição, mas não houve anúncios públicos sobre como ou quando a organização será formada.
A Autoridade Palestina, que governa partes da Cisjordânia ocupada por Israel, deverá realizar reformas antes de finalmente assumir um papel em Gaza, mas também não foi anunciado o conteúdo dessas reformas.
Segundo o acordo, o governo de Gaza deveria ser supervisionado por um Conselho Internacional de Paz presidido por Trump. Ele disse que isso será anunciado no início de 2026, mas a composição do conselho ainda é incerta.
Segundo o plano Trump, o Hamas pretende abandonar suas armas, mas o grupo disse que só fará isso quando for criado um Estado palestino. A retirada de tropas israelenses de outras regiões de Gaza estão condicionadas ao desarmamento do Hamas.
O cessar-fogo vai durar?
Israel indicou repetidamente que vai retomar a ação militar para desarmar o Hamas se o grupo não concordar em fazer isso de forma pacífica.
Além disso, muitos israelenses e palestinos suspeitam que o plano Trump nunca será plenamente concretizado e que o conflito continuará congelado indefinidamente.
Os israelenses temem que o Hamas possa se reestruturar e ameaçar outro ataque como o de 7 de outubro de 2023. Já os palestinos temem que Israel se retire totalmente de Gaza ou permita sua reconstrução total, deixando o território em ruínas e o povo sem futuro.
Os destacamentos militares e os planos de construção apontam para uma possível divisão do território em duas partes: uma área diretamente controlada por Israel e grupos anti-Hamas; e outra área controlada pelo Hamas, sem reconstrução ou retomada de serviços.
Quais são as chances de uma paz duradoura?
A solução de dois Estados, vista pela maioria dos países como a melhor oportunidade para uma paz duradoura, nunca pareceu tão remota – apesar do crescente reconhecimento internacional de um Estado palestino.
O plano Trump reconhece a autodeterminação e a criação de um Estado como aspirações do povo palestino, mas o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, descartou esta possibilidade diversas vezes.
As eleições em Israel estão previstas para 2026, mas não há indicação de que qualquer potencial novo governo aceitaria a independência palestina.

