Uma mulher de 60 anos, moradora de Long Island, no norte dos Estados Unidos, foi diagnosticada com chikungunya — uma doença viral transmitida por mosquitos e considerada típica de regiões tropicais.
O caso chamou a atenção de autoridades de saúde porque ocorreu em uma área de clima frio, onde o vírus raramente circula. A paciente apresentou febre alta, dores intensas nas articulações e erupções na pele — sintomas clássicos da infecção causada pelo vírus chikungunya.
Segundo os relatos, ela não havia viajado recentemente para o exterior, o que indica que a transmissão ocorreu localmente. O episódio foi confirmado por autoridades de saúde pública de Nova York e é o primeiro caso originário registrado na região.
Especialistas afirmam que esse tipo de ocorrência, antes improvável em lugares de clima temperado, está se tornando mais comum à medida que o planeta aquece.
O aumento das temperaturas, somado à mobilidade internacional e à adaptação dos mosquitos vetores, favorece o avanço de doenças como dengue, zika e chikungunya para áreas antes consideradas seguras.
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Clima: uma nova realidade
A infectologista Larissa Tiberto explica que o surgimento de uma doença tipicamente tropical em uma região fria como Long Island pode ser explicado por três fatores principais: a presença dos vetores apropriados — especialmente os mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus —, a adequação climática temporária ou sazonal e a introdução do vírus em uma população com baixa imunidade.
“As mudanças climáticas ampliam a estação de transmissão e reduzem a mortalidade invernal do mosquito, o que pode transformar surtos esporádicos em transmissão recorrente”, observa.
Segundo ela, fenômenos como invernos mais quentes e chuvas irregulares criam ambientes ideais para a reprodução dos mosquitos, mesmo em cidades afastadas do clima tropical.
O aumento de recipientes com água parada, o armazenamento incorreto de pneus e entulhos e a baixa adesão ao uso de repelentes também estão entre os fatores comportamentais que ampliam o risco de disseminação.
Doenças tropicais ganham terreno
Além da chikungunya, outras doenças transmitidas por vetores preocupam especialistas. “Dengue, zika, febre do Nilo Ocidental e até a malária vêm sendo registradas fora das zonas tropicais. A França e a Alemanha, por exemplo, já notificaram casos locais de dengue e zika em 2025”, alerta o médico infectologista Marcelo Daher, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia.
O maior risco está na presença consolidada dos mosquitos em novas regiões. “Quando o vetor se estabelece, basta a entrada de uma pessoa infectada para que o vírus se propague. O mosquito pica o viajante doente, se infecta e passa a transmitir localmente”, afirma Daher.
De acordo com Larissa, países desenvolvidos têm uma boa estrutura de vigilância epidemiológica, mas ainda enfrentam desafios. “A vigilância é majoritariamente passiva, depende de suspeição clínica e testagem oportuna, o que pode subestimar casos e atrasar respostas”, afirma. Ela reforça que é essencial fortalecer a triagem laboratorial e a comunicação de risco.
A infectologista Eveline Vale acrescenta que o aquecimento global e o aumento da mobilidade humana internacional ampliam as zonas de risco.
“Viajantes infectados podem introduzir o vírus em áreas antes livres da doença, e os próprios vetores podem ser transportados por avião ou navios. Além disso, o desequilíbrio ambiental e a falta de saneamento favorecem a proliferação dos mosquitos”, pontua.

Vírus e vetores mais adaptados
Segundo os especialistas, o problema não se limita aos mosquitos. As mudanças climáticas alteram tanto o comportamento dos vetores quanto dos próprios vírus e parasitas.
Temperatura e umidade encurtam o período de incubação do vírus no mosquito e aumentam a frequência das picadas. Outro fator é que mutações recentes no vírus da chikungunya aumentaram sua capacidade de ser transmitido por Aedes albopictus, espécie que resiste melhor ao frio, facilitando surtos fora dos trópicos.
Prevenção continua sendo a chave
Apesar do cenário de alerta, a prevenção continua sendo a principal arma contra o avanço da doença. É fundamental eliminar criadouros, descartar água acumulada em vasos, calhas e pneus, além de usar repelentes e telas em portas e janelas.
É recomendado ainda que viajantes fiquem atentos aos sintomas após passagens por áreas com transmissão ativa. Febre alta e dor articular súbita devem ser investigadas. Em locais onde houver recomendação, deve-se considerar a vacinação quando disponível e acompanhar os alertas das autoridades de saúde.
O caso da moradora de Long Island é um sinal claro de que o aquecimento global e a expansão dos mosquitos vetores estão mudando o mapa das doenças infecciosas no mundo. O que antes era considerado “tropical” começa a se tornar uma preocupação global — até mesmo em regiões de clima frio, como o norte dos Estados Unidos.
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Fonte: Metrópoles
