Empresta ou divide cartão de crédito? Entenda riscos para contribuinte

A ampliação do monitoramento da Receita Federal sobre as movimentações financeiras – que atingem as transferências via Pix, o sistema de pagamentos em tempo real do Banco Central (BC) – também afeta os cartões de crédito.

Isso porque, a partir de 2025, um novo módulo foi incorporado ao sistema e-Financeira, tornando o envio de dados obrigatório para as administradoras de cartão de crédito (as chamadas “maquininhas”). As informações já eram prestadas à Receita desde 2003 por meio da Declaração de Operações com Cartões de Crédito (Decred), que foi descontinuada.

Entenda o que muda com a nova regra

  • Com as novas regras, além das instituições financeiras tradicionais, as entidades como administradoras de cartão de crédito e instituições de pagamento devem enviar informações para a Receita por uma ferramenta específica de comunicação, a e-Financeira;
  • Pix que somarem pelo menos R$ 5 mil por mês para pessoas físicas (CPF) e R$ 15 mil para empresas (CNPJ) serão declarados à Receita;
  • Antes, somente os bancos tradicionais (públicos e privados) repassavam essas informações. Como o Pix e as maquininhas são tecnologias novas, a Receita diz estar se adequando às inovações com a atualização nas regras;
  • Empréstimo de cartão de crédito a terceiros é um costume brasileiro sem base legal e coloca o contribuinte em risco não apenas do ponto de vista fiscal, mas também do ponto de vista creditício, dado o risco de inadimplência do terceiro;
  • Fisco diz que as informações sobre o uso de cartões de crédito já são prestadas há mais de 20 anos. E alega que se o contribuinte não teve problema antes, também não terá agora.

O secretário especial da Receita, Robinson Barreirinhas, afirmou que nada muda em relação ao cartão de crédito. “Até porque a informação sobre os cartões de crédito já era prestada para a Receita Federal desde 2003”, lembrou.

Segundo o secretário, não haverá risco de ter problema com o Fisco. “Não é porque em um determinado mês você gastou um pouco mais que isso vai gerar algum problema com a Receita Federal. A Receita Federal coleta informações de uma série de outras fontes para cruzar esses dados. A Receita Federal sabe as relações que cada pessoa tem com empresas e com parentes”.

Segundo especialistas consultados pelo Metrópoles, no entanto, o contribuinte deve redobrar a atenção, pois o Leão estará mais atento às divergências nas movimentações.

“O empréstimo do cartão de crédito a familiares e amigos pode gerar despesas nesse cartão incompatíveis com a renda daquele que empresta. Se isso acontecer, ocorrerá um acréscimo patrimonial a descoberto, ou seja, uma despesa não justificada pelos rendimentos do contribuinte. Esse valor será tributado pelo imposto de renda e acompanhado de multa”, explica Jules Queiroz, doutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade de São Paulo (USP).

Segundo Queiroz, há possibilidade de cair na malha fina em razão dessa divisão do cartão, pois os sistemas da Receita detectam a ocorrência desse tipo de inconsistência, o que levará o contribuinte a ter que se explicar.

Na mesma linha, o advogado especialista em direito tributário Gabriel Santana Vieira sustenta que a Receita utiliza ferramentas avançadas de cruzamento de dados para identificar inconsistências entre rendimentos e despesas.

“Caso a fatura ultrapasse o que foi informado no Imposto de Renda, o contribuinte deve justificar a origem dos recursos. Dependendo da situação, os valores excedentes podem ser registrados como doação (sujeita a tributação estadual) ou empréstimo, com a devida comprovação, como transferências bancárias e recibos”, analisa Vieira.

A Receita diz que o sigilo bancário e a proteção de dados pessoais seguirão resguardados, já que serão informados apenas os valores globais movimentados (de entrada e de saída), sem especificação de destino, isto é, sem detalhamento sobre quem pagou ou onde o dinheiro foi gasto.

Afinal, qual a orientação?

Especialistas alertam que a ausência de justificativas claras pode levar o contribuinte à malha fina e à aplicação de multas. É possível declarar os valores como doação ou empréstimo, mas a recomendação mais segura é evitar emprestar o cartão de crédito, tanto para proteger suas finanças quanto para prevenir complicações fiscais e desgastes em relacionamentos pessoais.

O contribuinte deve declarar toda a renda tributável na declaração. No caso de empréstimo de cartão a terceiros, é bem difícil justificar a inconsistência, visto que em geral são despesas de terceiros realizadas a crédito do contribuinte.

A rigor, esse empréstimo não tem base jurídica e as despesas são presumidas como realizadas pelo contribuinte, argumenta o advogado Gabriel Vieira. Ele vê a possibilidade de se tentar equiparar o pagamento dessa fatura por terceiro como uma doação, mas além de não ser juridicamente o caminho mais correto, seria preciso recolher imposto estadual sobre doações.

“O empréstimo de cartão de crédito a terceiros é um costume brasileiro sem base legal e coloca o contribuinte em risco não apenas do ponto de vista fiscal, mas também do ponto de vista creditício, dado o risco de inadimplência do terceiro”, resume Vieira. “Se o terceiro não tem crédito na praça para obter um cartão próprio, é bem provável que ele não tenha recursos para pagar dívidas contraídas em nome de outras pessoas”, complementa.

Portanto, a recomendação é manter controle sobre as próprias movimentações financeiras. “Se a prática for inevitável, registre tudo e mantenha comprovantes em dia. Afinal, quando o assunto é cartão de crédito, segurança e transparência são indispensáveis”, alerta Vieira.

Mudanças serão sentidas em 2026

O prazo para que os primeiros dados sejam apresentados ao Fisco pelas fintechs e instituições de pagamento é até o último dia útil de agosto – neste ano, 29/8. Sobre o segundo semestre de 2025, o prazo vai até o último dia útil de fevereiro de 2026.

Isso significa que os dados constarão na declaração do próximo ano, referente ao ano-calendário de 2025.



Fonte: Metrópoles

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