O Tribunal de Contas da União (TCU) vê um risco de que medidas “parafiscais” na gestão orçamentária do governo levem à perda de credibilidade nas contas públicas, com efeitos adversos sobre indicadores macroeconômicos já no curto prazo, como desvalorização do real e maiores expectativas de inflação.
A CNN teve acesso a quatro achados preliminares de uma auditoria do tribunal, ainda em curso, para identificar e analisar o financiamento e a execução de gastos públicos com recursos extraorçamentários.
O ministro Bruno Dantas, relator do processo no TCU, convidou integrantes da equipe econômica e parlamentares diretamente envolvidos na elaboração do orçamento de 2026 para uma audiência pública na próxima quarta-feira (23). As conclusões preliminares já foram compartilhadas com os convidados.
O objetivo do ministro é apresentar os principais achados da auditoria, que tem término previsto para maio, e discuti-los com as autoridades. São quatro pontos:
- Não recolhimento de receitas públicas à Conta Única do Tesouro. Dois exemplos foram identificados:
* O PL 3.335/2024, que propõe o repasse direto à Caixa Econômica Federal de recursos oriundos da exploração de petróleo e gás, no valor estimado de R$ 13,6 bilhões, para custeio do Novo Auxílio Gás, sem passar pelo Orçamento Geral da União (OGU).
* Honorários advocatícios de advogados públicos: desde 2017, esses valores vêm sendo tratados de forma extraorçamentária, totalizando aproximadamente R$ 14,9 bilhões até o momento, conforme dados do Portal da Transparência. - Utilização de fundos privados ou entidades para execução de políticas públicas. Exemplos identificados:
* Programa Pé-de-Meia: financiamento com recursos de fundo privado, sem dotação autorizada na Lei Orçamentária Anual (LOA).
* Fundo Rio Doce: acordo para repasse de R$ 29,75 bilhões à União, com destinação direta ao BNDES para implementação de políticas públicas, sem trânsito pelo OGU. - Utilização de fundos públicos em políticas de concessão de crédito. Exemplos:
* Repasses de recursos de fundos públicos ao BNDES: repasse de mais de R$ 30 bilhões ao banco, em 2024, para políticas de crédito subsidiado.
* Faixa 4 do Programa Minha Casa, Minha Vida: recursos transferidos como receitas financeiras, sem impacto direto no resultado primário, mas com potencial repercussão na dívida líquida do setor público. - Falta de transparência na gestão de fundos públicos e privados. Exemplos: inexistência de uma plataforma centralizada e acessível ao público, com informações completas e atualizadas sobre os fundos utilizados para financiar políticas públicas.
A apuração preliminar do TCU indica que essas “práticas heterodoxas” comprometem a integridade, a transparência e a sustentabilidade do regime fiscal.
Os riscos, segundo a auditoria, são de “conflitos” entre as políticas fiscal e monetária.
Para o tribunal de contas, a perda de credibilidade tem uma série de “consequências adversas”: elevação das expectativas de inflação, aumento das taxas de juros básicas, desvalorização cambial, descontrole da dívida pública, encarecimento do crédito para o consumidor.
Entre as autoridades convidadas pelo TCU para a audiência pública de quarta-feira estão os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento), o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, os presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, e da Caixa Econômica Federal, Carlos Vieira.
Também foram chamados o presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), senador Efraim Filho (União-PB), e os deputados Carlos Zaratini (PT-SP) e Isnaldo Bulhões (MDB-AL), respectivamente relatores da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2026.
A investigação do TCU é conduzida Conduzida pela Unidade de Auditoria Especializada em Orçamento, Tributação e Gestão Fiscal (AudFiscal). Ela teve início em novembro de 2024 e estava sob a relatoria do ministro Vital do Rêgo.
Como Vital assumiu a presidência do órgão de controle, a relatoria passou para Dantas.
Este conteúdo foi originalmente publicado em TCU chama equipe econômica para apontar risco em medidas parafiscais no site CNN Brasil.
Fonte: CNN