Se ele estivesse vivo, hoje estaria com 96 anos de idade e, com certeza, fazendo as mesmas coisas às quais sempre se dedicou ao longo de quase um século de vida em prol dos mais pobres e oprimidos.
Nascido da cidade de Pologna, na Itália, no dia 2 de Abril de 1926, Paolino Maria Baldassari chegou a ser convocado pelo Exército de seu país para combater as tropas nazistas na Segunda Guerra mundial.
A missão de seu grupamento era proteger as linhas de telecomunicação dos aliados no campo de batalha. Mas antes que fosse necessário disparar um único tiro contra alguém, o jovem missionário decidiu desertar para concluiu os estudos de sacerdote do outro lado do Mundo.
Ele veio parar no Brasil, mais precisamente na cidade de São Paulo, onde foi ordenado frei da Ordem dos Servos de Maria e por opção própria decidiu vir catequizar na região mais pobre do país naquela época.
A cidade de Boca do Acre, no Sudoeste do Amazonas, divisa com o Acre, foi o local escolhido para o inicio de uma trajetória de luta em defesa do meio ambiente, proteção dos povos tradicionais, combate à desigualdade social e alfabetização da população pobre como forma de libertação da miséria.
Não demorou muito para o frei Paolino ser designado a realizar o mesmo trabalho na cidade de Brasiléia (AC), onde já existia um grupo de seringueiros liderados por Wilson Pinheiro e o próprio Chico Mendes, empenhado em pregar os princípios básicos da teologia da libertação criada pela igreja católica na década de 70.
Ali ele construiu, em regime de mutirão com a população local, o primeiro templo da Igreja Católica na região do Vale do Alto Acre, usando cacos de garrafas de vidro recolhidas da rua para suprir a necessidade de concreto na obra.
Ele ele também participou da criação de sindicatos e associações e orientou os idealizadores do movimento popular conhecido por “empate” a formarem cordões humanos em torno de grandes áreas de floresta para impedirem que as arvores fossem derrubadas a golpes de motosserra por pecuaristas vindos de outras regiões do país.
Depois se mudou para a cidade de Sena Madureira, na bacia do rio Purus, também no interior do Acre, onde viveu por 68 anos da mesma forma que já era acostumado por onde passou anteriormente.
“Aqui em Sena Madureira não tem uma só família, seja católica ou evangélica, que no seu álbum de fotografias não tenha o registro de um momento importante ao lado do Padre Paolino”, afirma o aposentado Altino Ferreira.
A história da cidade de Sena Madureira e seus 38 mil habitantes se confunde com a própria trajetória de vida de seu vigário mais ilustre de todos os tempos. Ali, o padre Paolino construiu escolas, pagou professores com dinheiro do próprio bolso e fundou cooperativas para fomentar a comercialização direta da produção dos colonos e seringueiros.
Criou um calendário religioso-cultural que virou tradição na cidade e até hoje, seis anos após sua morte, ainda é mantido pela paróquia local e atrai visitantes de várias partes do Estado, principalmente no mês de Maio, quando ocorre o arraial.
O convívio com os povos indígenas e a população tradicional da Amazônia lhe trouxe grandes conhecimentos sobre plantas medicinais e ele passou a exercer a medicina alternativa orientando as pessoas sobre o uso de medicamentos não químicos.
Sua rotina diária, ao longo da vida, se dividiu entre as atividades paróquias da igreja e o trabalho assistencial que realizava em diversos seguimentos sociais. Inclusive nas áreas de direitos humanos e meio ambiente que lhe renderam diversos prêmios nacionais e até internacionais.
Por sua luta contra os crimes de pistolagem praticados por fazendeiros contra colonos e indígenas na disputa pela posse da terra, Padre Paulino chegou a ser indicado ao Prêmio Nobel da Paz, em 1.993, mas perdeu para o africano Nelson Mandela.
Aos 90 anos de vida, ele se orgulhava de ter vencido 62 malarias, três tipos diferentes de hepatites e saído ileso de quatro tentativas de homicídios. No entanto, a exatos seis anos, no dia 8 de Abril de 2016, foi surpreendido pelo coração que se recusou a continuar batendo no minuto seguinte.
Padre Paulino Maria Baldassari, o fugitivo de guerra que veio para a Amazônia brasileira salvar vidas, faleceu no hospital de urgência e emergência de Rio Branco, capital do Acre, após 11 dias internado lutando contra uma anemia aguda.
Em 2017, o Vaticano enviou uma missão ao Acre para iniciar o processo de solicitação de beatificação e canonização do frei Paulino, carinhosamente apelidado de “O vigário da Floresta”.