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Jovem espera por cirurgia com técnica de 1928 que pode salvar sua vida

Jovem espera por cirurgia com técnica de 1928 que pode salvar sua vida

Aos 24 anos, Gabriel Oliveira luta para sobreviver a uma infecção grave no quadril enquanto aguarda a autorização do plano de saúde para realizar uma cirurgia criada há quase um século, chamada Girdlestone.

Diagnosticado com paralisia cerebral ainda bebê, Gabriel nasceu prematuro, aos seis meses de gestação, e recebeu alta mesmo necessitando de cuidados intensivos. Quinze dias depois, sofreu uma parada cardiorespiratória que privou seu cérebro de oxigênio e deixou sequelas permanentes, entre elas tetraplegia mista.

Apesar das limitações motoras, o jovem surpreendeu médicos e professores: estudou em escola especial, desenvolveu boa adaptação cognitiva e até ingressou na faculdade.

A vida estabilizada começou a mudar em 2021, quando Gabriel, cadeirante, desenvolveu lesões por pressão no quadril. As feridas cresceram, infeccionaram e exigiram internações, curativos diários e longos ciclos de antibióticos.

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Desde 2024, o tratamento se tornou ainda mais intenso, com medicamentos fortes e efeitos colaterais que se acumulavam sem resultado expressivo. A piora levou ao diagnóstico de osteomielite — uma infecção profunda do osso, descrita pela medicina há mais de três mil anos e ainda considerada um dos quadros ortopédicos mais difíceis de tratar.

Segundo o ortopedista Mário Soares, especialista em infecções osteoarticulares e membro da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT), a osteomielite ocorre quando bactérias alcançam o interior do osso, seja pela corrente sanguínea ou pela abertura da pele — como acontece em feridas extensas.

Ali, esses microrganismos se instalam, destroem estruturas internas e matam o tecido ósseo. “Antibióticos sozinhos não resolvem. É como um canal dentário: você precisa remover o material comprometido, limpar e reconstruir”, explica o médico.

Em casos graves, como o de Gabriel, o risco de amputação ou até de morte tornam o tratamento cirúrgico urgente. Segundo o especialista, por causa da paralisia cerebral, Gabriel não pode receber uma prótese no quadril — procedimento que seria o mais indicado para reconstrução.

Cirurgia com técnica antiga ainda é a mais promissora

Pessoas com limitações motoras importantes têm maior risco de deslocamento da prótese, rejeição, complicações pós-operatórias e não ganhariam mobilidade adicional. Sem essa opção, resta apenas uma alternativa considerada o “último recurso”: a cirurgia de Girdlestone, criada em 1928 por Gathorne Robert Girdlestone, antes mesmo da descoberta dos antibióticos.

Cirurgia de Girdlestone: o que é e para quem é indicada

O procedimento consiste em remover totalmente a articulação do quadril, retirando a cabeça do fêmur e desfazendo a ligação com a bacia. A perna fica mais curta e rodada para fora, e a função motora é reduzida  — mas a dor desaparece e o foco de infecção é finalmente eliminado.

Com o tempo, cirurgiões passaram a preencher o espaço vazio com retalhos musculares para dar maior estabilidade, mas a essência da técnica permanece a mesma do século 20.

“É uma cirurgia que salva vidas. Alivia a dor intensa, elimina a infecção e permite que o paciente volte a se posicionar melhor na cama, reduzindo contraturas e facilitando cuidados básicos”, explica Soares.

Nos últimos anos, o tratamento da osteomielite avançou principalmente com o uso de antibióticos aplicados diretamente na ferida após a limpeza cirúrgica, alcançando concentrações centenas de vezes maiores do que as obtidas por comprimidos ou medicação intravenosa.

Técnicas modernas também se concentram na recuperação dos tecidos ao redor — pele, músculos e tendões — que são igualmente atingidos. Ainda assim, de acordo com Soares, esse tipo de infecção continua sendo um desafio global e poucos especialistas têm formação específica para lidar com casos complexos como o de Gabriel.

Enquanto aguarda a cirurgia, Gabriel enfrenta dor intensa, mobilidade ainda mais limitada e risco contínuo de agravamento da infecção. Sua mãe, Juliana Oliveira, 43 anos, cuida dele integralmente e trava uma batalha judicial para que o plano de saúde autorize o procedimento.

Foto colorida de mulher ao lado de jovem cadeirante, em frente a um lado - Metrópoles. Gabriel Oliveira, 24 anos, e a mãe, Juliana, que luta ao lado do filho pela cirurgia de Girdlestone

A família acredita que, com a cirurgia de Girdlestone, Gabriel terá alívio da dor e a chance real de interromper o ciclo exaustivo de antibióticos que já dura quase um ano. Para eles, trata-se da única oportunidade de preservar sua vida e devolver um mínimo de conforto ao jovem que, apesar de todas as dificuldades, sempre encontrou maneiras de seguir em frente.

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Fonte: Metrópoles

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