Testes de paternidade frequentemente revelam situações inesperadas, mas o caso de um homem de Washington, nos Estados Unidos, trouxe à tona um quebra-cabeça genético sem precedentes. Após passar por tratamentos de fertilidade e celebrar o nascimento de um filho, ele e sua parceira foram pegos de surpresa por exames que indicavam que o homem não poderia ser o pai biológico da criança. As informações são da revista Time.
Ao realizarem dois testes de paternidade, os resultados mostraram que o homem compartilhava apenas 10% de seu DNA com o filho. Com isso, o casal começou a suspeitar que a clínica de fertilidade poderia ter utilizado o esperma de outro doador. Preocupados, eles contrataram um advogado, que recorreu ao blog Ask a Geneticist, mantido por Barry Starr, diretor de extensão do Departamento de Genética da Universidade de Stanford.
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Starr sugeriu uma análise genética mais aprofundada do casal, recorrendo a uma empresa de testes genéticos voltada ao consumidor. Esses testes, que analisam centenas de milhares de marcadores genéticos, fornecem um retrato muito mais detalhado de relações e ancestralidade do que os testes tradicionais de paternidade, que analisam apenas algumas dezenas de marcadores.
No entanto, quando os resultados chegaram, Starr logo identificou algo intrigante: os dados sugeriam uma relação de 25% de compartilhamento genético entre o homem e a criança – um padrão típico de parentesco entre tios e sobrinhos. Essa descoberta levantou uma hipótese surpreendente: de acordo com o exame, o homem seria, de certa forma, tio de seu filho, porém não tinha como a criança ser filho de seu irmão, pois o homem é filho único.
Síndrome do gêmeo desaparecido
A explicação para esse enigma estava em um fenômeno raro conhecido como quimerismo. Durante o desenvolvimento embrionário, o homem havia absorvido células de seu irmão gêmeo fraterno, que não sobreviveu. Essa condição, chamada de síndrome do gêmeo desaparecido, ocorre em cerca de 20% a 30% das gestações múltiplas.
No caso deste homem, algumas das células absorvidas eram germinativas – precursoras de espermatozoides – e continham o DNA do gêmeo não nascido. Assim, o esperma que gerou o menino continha uma mistura de 90% do DNA do pai e 10% do DNA do irmão gêmeo, e na inseminação o gene que prevaleceu foi os 10% do gêmeo não nascido do pai da criança.
“Ele é, ao mesmo tempo, pai e tio de seus filhos”, explica Starr. Casos como esse são extremamente raros, mas destacam a complexidade e as nuances da biologia humana.
Misturas de DNA no corpo humano
Embora o quimerismo seja incomum, ele não é inédito. Em casos anteriores, foi descoberto que algumas pessoas possuem células com DNA diferente do seu. Mulheres que deram à luz, por exemplo, frequentemente retêm células de seus filhos, incluindo aquelas com cromossomos Y no caso de bebês do sexo masculino. Essas células podem se alojar em diferentes partes do corpo, incluindo pulmões, tireoide, coração e até cérebro.
O caso deste homem, no entanto, é especial porque envolveu células germinativas. Durante o estágio inicial do desenvolvimento embrionário, o sistema imunológico ainda não está formado para reconhecer essas células como “estranhas”. Como resultado, as células do gêmeo foram integradas ao organismo do homem, tornando-se parte de seu próprio corpo.
Impactos científicos
Para Dieter Egli, cientista da Universidade de Columbia especializado em células-tronco, esse caso ilustra as complexidades do quimerismo e seus paralelos com transplantes de órgãos e terapias celulares. “É fascinante pensar como essa mistura de DNA pode influenciar a percepção de identidade da pessoa”, reflete Egli, destacando que questões como essa serão cada vez mais relevantes com o avanço das terapias genéticas.
Além do impacto emocional, o caso também revela desafios médicos. Starr aponta que os tecidos e órgãos do homem provavelmente contêm diferentes proporções dos DNAs misturados. Até mesmo seu tom de pele apresenta um padrão distinto, com listras mais escuras derivadas do DNA do gêmeo, visíveis contra sua pele mais clara.
O caso já foi apresentado no Simpósio Internacional sobre Identificação Humana e na Sociedade Americana de Genética Humana, e a equipe de Starr pretende publicá-lo em um artigo científico detalhado.
Fonte: Portal LEODIAS